203ª e 204ª Sessões Ordinárias do Tribunal do CADE, realizadas em 05 e 25 de outubro de 2022.
Pautas, atas e áudio da sessão disponíveis em https://www.gov.br/cade/pt-br

 

Destaques do CADE


 

CADE assina acordo de cooperação técnica com o BNDES

O CADE assinou, no dia 25 de outubro, acordo de cooperação técnica junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A parceria, cujo propósito é compartilhar conhecimento e facilitar ações conjuntas, terá vigência de cinco anos e buscará promover grupos de trabalho, eventos educativos, materiais orientativos e intervenções conjuntas em processos judiciais.

 

CADE antecipa comunicação de cartéis ao Ministério Público

O CADE publicou, em 18 de outubro de 2022, a Portaria Normativa nº 21/2022, cujo propósito é disciplinar a comunicação, pela Superintendência-Geral (SG), de recomendações em casos de cartel ao Ministério Público (MP). Anteriormente, a comunicação ao MP ocorria somente depois do Tribunal do CADE confirmar a recomendação de condenação da SG. Com a nova Portaria, a SG compartilhará a versão pública da Nota Técnica com recomendações em casos de cartel antes da decisão pelo Tribunal do CADE.

 

Destaques do Poder Judiciário


 

TRF1 suspende processo no CADE devido a possível prescrição intercorrente

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu dar provimento a recurso interposto pelas empresas Pares Eletrônica Comercial e Industrial Ltda. (Pares Comercial), Elektrotech Comercial e Industrial Ltda. (Elektrotech), e seus funcionários, que solicitaram a suspensão, até decisão judicial definitiva, de processo administrativo alegadamente sem atos instrutórios por mais de três anos[1].

Em dezembro de 2014, a Superintendência-Geral do CADE decidiu instaurar investigação para apurar suposto cartel no mercado nacional de instrumentos eletrônicos para testes e medição. Segundo a SG, existiriam indícios de que distribuidores teriam fraudado licitações entre 2002 e 2012 por meio da apresentação de propostas de cobertura, facilitados por fornecedora comum que auxiliava na troca de informações. Após a instauração do processo administrativo, a SG conduziu oitiva de testemunhas em 2016 e, desde então, proferiu dois despachos solicitando esclarecimentos adicionais das investigadas. No início de 2022, a SG encerrou a fase de instrução, recomendando a condenação de representados pela prática de cartel.

As investigadas apresentaram então Mandado de Segurança com pedido de urgência perante a Justiça Federal para suspender o processo administrativo até o julgamento final da ação judicial. Segundo as representadas, teria ocorrido prescrição intercorrente, dado que a SG teria passado mais de três anos sem instruir o processo, já que, segundo as representadas, despachos solicitando informações adicionais das investigadas não poderiam interromper a prescrição. Assim, o processo deveria ser arquivado.

Em decisão liminar, o TRF1 deferiu o pedido de antecipação de tutela para suspender o processo administrativo do CADE, reconhecendo a probabilidade do direito das recorrentes. Isso porque, segundo a decisão, “a simples solicitação de informações nos despachos não configura ato com força de movimentação processual ou ato inequívoco que importe apuração do fato, de forma a afastar a inércia administrativa no caso concreto, tratando-se de atos de impulso oficial. Como se nota, portanto, os atos processuais praticados constituem simples expedientes de impulsão física do processo (sem caráter opinativo ou instrutório), não se encaixando nas hipóteses legais de interrupção da prescrição”. Dessa forma, a tramitação do processo administrativo perante o CADE foi suspensa enquanto vigorarem os efeitos da decisão do TRF1.

 

Destaques da SEAE


 

SEAE realiza consulta pública sobre distribuição de dividendos por Sociedades Anônimas

A Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Economia (SEAE) está promovendo consulta pública sobre os efeitos da obrigatoriedade de distribuição de dividendos por Sociedades Anônimas, prevista pela Lei nº 6.404/76. Segundo a SEAE, a obrigação de distribuir dividendos pode dificultar o financiamento de determinadas empresas no mercado de capitais e, com isso, prejudicar a concorrência. As contribuições complementarão a análise da SEAE e buscam garantir participação dos segmentos afetados e demais interessados no tema.

O prazo para contribuição vai até 20 de novembro. A consulta pública pode ser acessada na plataforma Participa+ Brasil[2].

 

Destaques da Superintendência-Geral do CADE


 

SG arquiva investigação envolvendo vale-benefícios na plataforma Ifood

A SG decidiu arquivar investigação[3] de supostas condutas anticompetitivas pela iFood.com Agência de Restaurantes Online S.A. (iFood) consistentes no alegado uso indevido de dados, subsídios cruzados e discriminação de rivais no mercado de vale-benefícios por meio da plataforma iFood.

Em março de 2022, a Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT) apresentou representação ao CADE, alegando que o iFood estaria se valendo de sua posição dominante no mercado de plataformas online de refeições prontas, em que deteria participação de mercado de aproximadamente 70%-80%, para favorecer seu próprio vale-benefício, o “iFood Benefícios”, em detrimento dos de rivais. Segundo a ABBT, o iFood estaria utilizando a base de dados da plataforma para prospectar negócios para o iFood Benefícios, e se valendo de taxas excessivas cobradas na plataforma para subsidiar descontos e outras vantagens, além de discriminar rivais na plataforma. Além disso, para a ABBT, a plataforma iFood seria um insumo essencial para empresas de vale-benefícios. A ABBT requereu, então, a abertura de investigação e a adoção de medida preventiva que suspendesse vantagens ou descontos ofertados pelo iFood Benefícios.

A SG instaurou, então, inquérito administrativo, mas solicitou manifestação do Ifood antes da apreciação da medida preventiva. O Ifood apresentou resposta alegando que o Ifood Benefícios seria um entrante no segmento e que sua participação no mercado de plataformas digitais de delivery de refeições prontas seria irrelevante para análise do caso, dado que empresas de vale-benefícios não dependem do Ifood para concorrer no mercado. Ademais, segundo o Ifood, não existiria racionalidade na conduta de discriminação de rivais, pois a maior parte das transações dentro da plataforma são feitas com vale-benefícios rivais e, como plataforma de dois lados, o Ifood precisaria atrair tanto consumidores quanto prestadores de serviço. Em junho, após manifestações do iFood e de outras empresas consultadas, a SG decidiu indeferir o pedido da medida preventiva. Segundo a SG, as condutas careceriam de verossimilhança, dada a necessidade de uma instrução probatória mais aprofundada. Ademais, não existiria perigo na demora, dado que a participação do iFood Benefícios no mercado de vales benefícios seria irrisória, sendo que a suspensão de algumas de suas ofertas poderia prejudicar a entrada no mercado.

Finalmente, em outubro, após novas manifestações do iFood, da representante e de terceiros consultados, a SG decidiu arquivar a investigação. Segundo a decisão, não existiriam indícios de que rivais dependem do iFood, posto que o valor gasto via vale-benefícios na plataforma seria muito inferior ao total gasto no mercado. Além disso, não existiriam indícios de alavancagem, pois o crescimento do iFood Benefícios não seria superior ao de seus rivais e não seria possível determinar se as taxas cobradas na plataforma iFood seriam excessivas, como alegado pela ABBT. A SG também descartou a acusação de discriminação, pois identificou que a proporção no uso de vale-benefícios na plataforma iFood corresponderia às participações de mercado das empresas do setor, sendo que o iFood não teria incentivo para discriminar rivais, já que constituem as principais formas de pagamento na plataforma. Ainda, não seria possível afirmar que a base de dados utilizada pelo iFood teria garantido alguma espécie de vantagem competitiva e seria distinta daquelas obtidas via pesquisa ou via aquisição com empresas de inteligência de mercado, dado que a ABBT não especificou os supostos dados que garantiriam vantagem competitiva ao iFood Benefícios. Por fim, o iFood não tem capacidade de prospectar-se no mercado de vales benefício por meio dos dados que possui de seus consumidores, posto que estes utilizam, em sua maioria, outros meios de pagamento que não vales benefício.

Diante do arquivamento, a ABBT apresentou recurso contra a decisão, ainda pendente de decisão pela SG.

 

SG arquiva investigação envolvendo serviços de busca do Google

A SG decidiu arquivar investigação envolvendo suposto desvio, por Google Inc. e Google Brasil Internet Ltda. (em conjunto Google), do tráfego de usuários dos serviços de busca local em favor dos seus próprios serviços de buscas verticais[4][5].

Em abril de 2016, o Yelp Inc. (Yelp), uma ferramenta de busca local por serviços e estabelecimentos comerciais, apresentou representação ao CADE alegando que o Google estaria se valendo de sua posição dominante em serviços de buscas gerais para desviar o tráfego de usuários em favor dos seu próprio serviço de busca vertical sobre locais. Segundo o Yelp, serviços de buscas gerais constituiriam um insumo essencial para que serviços de busca vertical pudessem prosperar, já que funcionariam como fonte relevante de usuários. O Google estaria, para o Yelp, favorecendo seu serviço de busca vertical, por meio da introdução do “Local Universal”, que lista resultados de busca vertical em uma ‘caixa’ em destaque na página inicial de resultados do Google. Segundo o Yelp, isso desviaria tráfego de serviços de busca vertical rivais, além de gerar resultados menos úteis aos usuários do que se o Local Universal do Google incluísse resultados de concorrentes como o próprio Yelp.

Em manifestações em resposta às alegações do Yelp, o Google argumentou que serviços de busca geral não constituem insumo essencial para serviços de buscas verticais, dado que ambos são parte de um mesmo mercado, competindo por usuários. Além disso, o Google apontou que passou a exibir resultados de busca local (Local Universal) no Brasil anos antes da entrada do Yelp no mercado doméstico, de forma que seria impossível identificar qualquer “desvio de tráfego” do Yelp no país como resultado de qualquer conduta do Google. Ainda, o Google argumentou que o Local Universal não impediu que concorrentes surgissem e prosperassem, como aconteceu com empresas como Guia Mais, Tripadvisor e Kekanto. Além disso, o Google afirmou que os testes realizados pelo Yelp para alegar que os resultados gerados pelo Local Universal seriam menos úteis aos usuários eram falhos, já que a metodologia proposta pelo Yelp geraria, na realidade, resultados de busca inadequados. Por fim, o Google argumentou que o Local Universal foi uma inovação legítima do design de seu produto assim reconhecida pelo próprio Yelp, que desejava apenas interferir em seu design para incluir resultados gerados por seu próprio serviço.

De fato, a SG entendeu que mesmo considerando conservadoramente serviços de busca vertical como parte de um mercado relevante distinto do mercado de buscas gerais, não seria possível afirmar que este último constituiria um insumo essencial ao primeiro. Segundo a SG, existiriam outros meios de acesso a usuários disponíveis às plataformas de busca vertical, como a contratação de publicidade. Ademais, os resultados do Local Universal ocupariam espaço limitado na página de resultados do Google. Além disso, o posicionamento do Local Universal seria uma escolha legítima de design do Google, e a intervenção em modelos de negócio de mercados digitais sem a devida comprovação de efeitos concretos ou efeitos potenciais razoáveis poderia causar efeitos inibidores à inovação. Por fim, os dados de tráfego gerado pelo Google a serviços de busca local concorrentes do Yelp mostrariam que não houve qualquer efeito negativo à concorrência. Assim, a SG decidiu arquivar a investigação.

 

SG arquiva investigação por incidência de prescrição

A SG arquivou investigação envolvendo suposto descredenciamento coordenado de médicos filiados à Cooperativa dos Cirurgiões de Pernambuco (COOPECIR) da Saúde-Recife, administradora do plano de saúde de servidores da Prefeitura do Recife, devido aos fatos investigados terem ocorrido mais de 5 anos antes da abertura da investigação[6].

Em 2019, o Ministério Público do Estado de Pernambuco encaminhou denúncia de cartel apresentada pela Saúde-Recife ao CADE, em que se narrava o suposto descredenciamento de três médicos especializados com fundamento em decisão da COOPECIR de que toda contratação de serviço de saúde suplementar deveria ocorrer através da cooperativa. Segundo a Saúde-Recife, além de influenciar a decisão dos médicos, a COOPECIR ainda estaria cobrando honorários abusivos para negociar o recredenciamento. Dessa forma, a SG decidiu instaurar investigação, solicitando manifestação da COOPECIR.

A COOPECIR apresentou defesa alegando que o descredenciamento dos médicos relatados pela Saúde-Recife ocorreu entre agosto de 2009 e setembro de 2010, o que descaracterizaria a suposta prática coordenada. Ademais, um dos médicos não seria filiado à COOPECIR à época dos fatos, de forma que a cooperativa não teria qualquer relação com a conduta. Segundo a COOPECIR, os preços seriam negociados contrato a contrato, sendo que a cooperativa não seria capaz de influenciar as condições do mercado.

A SG decidiu arquivar a investigação por incidência da prescrição quinquenal, isto é, por terem transcorrido mais de 5 anos entre os fatos narrados e a abertura da investigação. Segundo a SG, embora a Saúde-Recife impute à COOPECIR a prática de cartel, única infração administrativa com prazo prescricional de 12 anos, a denúncia teria sido dirigida apenas a um agente econômico, sendo que a configuração de cartel depende de dois ou mais agentes. A conduta apresentada na denúncia configuraria, na realidade, influência à adoção de conduta comercial uniforme, prática sujeita a prazo prescricional de 5 anos. Assim, como os fatos ocorrem entre 2009 e 2010 e o CADE só tomou conhecimento em 2019, teria ocorrido prescrição.

 

SG arquiva investigação envolvendo suposto gun jumping de Botafogo e Cruzeiro

A SG arquivou duas investigações envolvendo suposta consumação de compras de ações dos times de futebol Sociedade Anônima de Futebol Botafogo (Botafogo) e Cruzeiro Esporte Clube – Sociedade Anônima de Futebol (Cruzeiro) sem a aprovação obrigatória do CADE (gun jumping)[7].

A SG havia instaurado, em maio de 2022, investigações para apurar suposto gun jumping envolvendo a compra de ações dos times de futebol Botafogo e Cruzeiro. Segundo a SG, o empresário John Charles Textor, que detém participação em times de futebol no exterior, adquiriu ações do Botafogo, ao passo que a Tara Sports Brasil Participações Ltda. (Tara Sports), sociedade empresária detida por Ronaldo Luiz Nazário de Lima (popularmente conhecido como Ronaldo Fenômeno), adquiriu ações do Cruzeiro. Contudo, as operações não foram submetidas à apreciação do CADE.

Os times Botafogo e Cruzeiro foram notificados para se manifestarem nos autos. Segundo a direção dos times, as operações de fato ocorreram, mas as partes envolvidas não teriam faturamento igual ou superior ao mínimo exigido pela lei, de forma que não seriam de notificação obrigatória. De fato, segundo a SG, embora operações envolvendo Sociedades Anônimas de Futebol (SAF) possam constituir Ato de Concentração sujeito à notificação ao CADE, as partes envolvidas nas operações não preencheriam o critério do faturamento nos casos em concreto, de forma que não seriam de notificação obrigatória. Não obstante, a SG ressaltou que a análise do critério do faturamento das SAFs deveria considerar todas as receitas, operacionais e não operacionais, obtidas também pelo clube controlado.

Além disso, a SG considerou que não haveria razões para que o CADE exercesse a faculdade de solicitar a notificação das operações. Segundo a SG, os grupos compradores não teriam atuação prévia no segmento de prática de futebol em competição profissional no Brasil, de forma que as operações não envolveriam sobreposição horizontal. Da mesma forma, embora fosse possível aventar possível integração vertical entre, de um lado, as atividades de prática de futebol profissional do Cruzeiro e, de outro, as atividades de distribuição de conteúdo de mídia e serviços de marketing desportivo exercidas pelo grupo econômico da Tara Sports, a SG observou que, atualmente, o grupo econômico da Tara Sports não detém nenhum direito de transmissão e as atividades de marketing são voltadas a atletas e patrocinadores, mas não para SAFs.

 

SG arquiva investigação envolvendo fornecimento de CO2 pela White Martins

A SG decidiu arquivar investigação envolvendo suposta interrupção unilateral, pela White Martins Gases Industriais Ltda. (White Martins), do fornecimento de dióxido de carbono (CO2) para empresas produtoras de refrigerantes com base em critérios discriminatórios[8].

Em maio de 2022, o Deputado Federal Enio José Verri (PT/PR) apresentou Representação ao CADE alegando que a White Martins teria interrompido, unilateralmente, o fornecimento de CO2 para empresas de pequeno porte que dependeriam do gás para fabricação de refrigerantes. Segundo o Deputado, embora a White Martins estivesse enfrentando dificuldades na aquisição do insumo, a empresa teria deixado de fornecer CO2 exatamente para as menores empresas do setor, ao passo que teria mantido o fornecimento junto à Coca-Cola. Para o Deputado Federal, o critério de decisão da White Martins seria discriminatório e poderia ensejar o açambarcamento, isto é, a retenção de matérias-primas com propósitos anticompetitivos de prejudicar concorrentes, nos termos do art. 36, §3º, XIII da Lei nº 12.529/2011.

Segundo a SG, não existiriam indícios de açambarcamento, dado que a White Martins não teria deixado de fornecer CO2 para prejudicar concorrentes, mas sim como fruto de problemas na cadeia de suprimento, em especial, a White Martins não atua no segmento à jusante de produção de refrigerantes, de forma que não deteria incentivos para prejudicar outras empresas.

Não obstante, caso a White Martins detivesse posição dominante no segmento de gás carbônico e a decisão tivesse gerados danos ao mercado sem justificativas econômicas razoáveis, a decisão poderia, segundo a SG, ensejar a responsabilidade concorrencial da White Martins por caracterizar discriminação. A SG expediu, então, ofícios a empresas do setor para reunir informações.

Conforme apurado pela SG, não seria possível determinar se a White Martins detinha posição dominante, considerando que os dados de mercado apresentados pelos agentes do setor seriam discrepantes entre si. Não obstante, a determinação da posição dominante seria dispensável, pois a instrução foi capaz de demonstrar que a White Martins não privilegiou o fornecimento de CO2 à Coca-Cola, dado que suas subsidiárias teriam sido igualmente afetadas pela interrupção no fornecimento de CO2. Ademais, mesmo que a Coca-Cola tivesse sido proporcionalmente menos afetada, a White Martins apresentou fundamentos para a restrição de oferta e justificativas referentes à impossibilidade de atendimento da demanda total de CO2 de seus clientes, cuja priorização se deu com base em critérios objetivos pré-estabelecidos. Assim, a SG decidiu arquivar a investigação.

 

Destaques da Sessão de Julgamento


 

CADE aprova acordo para encerrar investigação de gun jumping no setor automotivo 

O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, homologar Acordo em Controle de Concentrações (ACC) proposto pela Grand Brasil Comércio de Veículos e Peças Ltda. (Grand Brasil) para encerrar investigação envolvendo a consumação de operação de transferência de concessionária antes da aprovação obrigatória do CADE[9].

Em 2019, a SG tomou conhecimento, por meio de resposta a ofício encaminhada pela Renault do Brasil S.A. (Renault), de operações de transferência de concessionárias envolvendo a Grand Brasil. A SG encaminhou então ofício à Grand Brasil solicitando informações sobre as operações realizadas pela empresa nos últimos 10 anos. Conforme apurado pela SG, a Grand Brasil realizou cinco operações de transferências de concessionárias, dentre as quais três foram notificadas ao CADE, mas duas não foram submetidas à aprovação da autarquia. Por sua vez, uma dessas duas operações não seria de notificação obrigatória, mas a outra, referente a transferência, pela Grand Brasil, da concessão de revenda da marca Renault para a Bis Distribuição de Veículos Ltda. (Bis) em 2016, configuraria Ato de Concentração sujeito a notificação obrigatória. Dessa forma, a SG instaurou investigação, recomendando, ao fim a condenação da Grand Brasil. Após a recomendação de condenação, a Grand Brasil e a Bis apresentaram proposta de ACC para encerrar a investigação.

Durante a 203ª Sessão Ordinária de Julgamento (SOJ), o Conselheiro Relator Victor Fernandes apresentou voto pela homologação do ACC proposto pelas investigadas. O Relator destacou que, embora a operação tenha ocorrido em 2016, não há limite temporal para avaliar operações consumadas sem a aprovação prévia do CADE. Além disso, a ausência de notificação constitui infração permanente, de forma que prescrição da pretensão punitiva do Estado ocorrente somente 5 anos após a “cessação dos atos de consumação da operação”, de forma que não teria havido prescrição no caso, já que as operações analisadas “se projetam no tempo”. Por meio do ACC, as empresas recolheram contribuição pecuniária no valor de R$ 2.535.841,18.

 

Tribunal condena cartel em licitação para locação de equipamentos e veículos

O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, condenar a empresa Cotrans Locação de Veículos Ltda. (Cotrans) por prática de cartel envolvendo licitações destinadas à locação de equipamentos e veículos para conservação, adequação e melhorias de estradas rurais no Estado do Paraná[10].

A investigação foi iniciada em 2019 após celebração de acordo de leniência entre a SG, o Ministério Público do Estado do Paraná e a empresa Ouro Verde Locação e Serviço S.A. (Ouro Verde). Segundo a leniência, oito empresas[11] teriam fraudado licitação do programa “Projeto Patrulha do Campo”, anunciado pelo então governador Carlos Alberto Richa, por meio da apresentação de propostas de cobertura e troca de informações sensíveis. Após a leniência, a empresa J. Malucelli decidiu firmar Termo de Compromisso de Cessação (TCC), reconhecendo a configuração da prática e se comprometendo a colaborar com a investigação.

Conforme apurado pela SG, os indícios envolvendo a Cotrans, incluindo depoimentos e registros de reuniões presenciais e conversas telefônicas realizadas entre a publicação do edital do certame, em 2011, e o efetivo cumprimento das obrigações, em 2014, seriam suficientes para configuração da infração. Contudo, com relação às demais empresas investigadas, não existiriam indícios suficientes de infração à ordem econômica.

Durante a 203ª SOJ, a Conselheira Relatora Lenisa Prado apresentou voto determinando a condenação da Cotrans a multa no valor de R$ 17.834.784,45, além da imposição à empresa de proibição de participar de licitações ou contratar com a administração pública pelo prazo de 5 anos. De outro lado, o voto determinou o arquivamento da investigação em relação às demais empresas por ausência de indícios suficientes de infração à ordem econômica. O voto foi seguido por unanimidade pelos demais conselheiros.

 

Tribunal confirma medida preventiva que suspende contratos de exclusividade da Ambev

O Tribunal do CADE decidiu acolher, por maioria, voto do Conselheiro Relator Gustavo Augusto de Lima para confirmar medida preventiva consistente na limitação de que a Ambev S.A. (Ambev) firme novos contratos de exclusividade junto a bares, restaurantes e casas noturnas (canal frio)[12][13], com a introdução de ajustes às obrigações impostas anteriormente em Despacho do Relator[14]. A medida também é aplicável à HNK BR Indústria de Bebidas Ltda. (Heineken) nas Unidades da Federação em que a empresa possua 20% ou mais de participação de mercado.

Em síntese, a Heineken apresentou Representação ao CADE alegando que a Ambev estaria abusando de sua posição dominante no mercado de cervejas para fechar o acesso de rivais a pontos de venda estratégicos, mediante contratos de exclusividade que impediam a venda de marcas concorrentes. A Heineken solicitou, então, a imposição de medida preventiva para fazer cessar os contratos de exclusividade da Ambev. A SG, contudo, negou a medida preventiva, afirmando ser necessário aprofundar a investigação. A Heineken interpôs, assim, Recurso Voluntário ao Tribunal do CADE. Em setembro, o conselheiro Relator Gustavo Augusto de Lima preferiu Despacho concedendo medida preventiva a fim de impedir que novos contratos de exclusividade fossem firmados pela Ambev junto a bares, restaurantes e casas noturnas (canal frio) até o final da Copa do Mundo do Catar, assim como para que, dentre outras obrigações, a Ambev limitasse contratos de exclusividade a 20% dos Pontos de Venda ou do volume de cerveja dentro de cada base territorial. A medida era igualmente aplicável à Heineken apenas nas Unidades da Federação em que detivesse participação igual ou superior a 20%.

A Ambev interpôs, então, Recurso Voluntário em face do despacho, alegando impossibilidade de concessão monocrática de medida preventiva pelo conselheiro relator e que os alegados patamares de fechamento de mercado não seriam corroborados por evidências robustas. Durante a 204ª SOJ, o conselheiro relator apresentou voto confirmando a medida preventiva, mas com ajustes nas obrigações impostas anteriormente. Segundo o conselheiro, a Lei nº 12.529/2011 possui previsão expressa de que, em qualquer fase do inquérito, o relator possui a prerrogativa de determinar medida preventiva, inclusive de ofício. Ademais, segundo o relator, os documentos acostados aos autos dariam conta de programas de exclusividade com abrangência superior a 20% do mercado em determinadas unidades da federação, havendo, portanto, evidência de fechamento de mercado.

De outro lado, o relator retirou do objeto da medida preventiva os pontos de venda temporários, cujas estruturas funcionam por, no máximo, 90 dias, e dispensou o monitoramento de municípios e conjuntos de bairros que apresentam baixos índices de fechamento de mercado no levantamento preliminar. O voto do relator foi seguido pelos demais conselheiros, à exceção da conselheira Lenisa Prado, que votou pelo indeferimento da medida preventiva, e do conselheiro Luis Braido, que divergiu de pontos específicos do voto.

 


NOTAS

[1] Agravo de Instrumento nº 1030909-71.2022.4.01.0000, interposto pelas representadas Pares Eletrônica Comercial e Industrial Ltda., Elektrotech Comercial e Industrial Ltda, Danielle Gonschorovski Stofella e Ricardo Stofella, com referência à Ação Mandamental nº 1034877-94.2022.4.01.3400 e ao Processo Administrativo nº 08700.010050/2014-23.

[2] Vide https://www.gov.br/participamaisbrasil/https-wwwgovbr-participamaisbrasil-me-seae-ts-flexdivid.

[3] Inquérito Administrativo nº 08700.001797/2022-09.

[4] Inquérito Administrativo nº 08700.003211/2016-94.

[5] A AJDC representou o Google nesse processo. Note-se que as descrições aqui refletem apenas da visão do escritório sobre decisões do CADE.

[6] Procedimento Preparatório nº 08700.005944/2019-14.

[7] Procedimentos de Apuração de Ato de Concentração nº 08700.003313/2022-58 e 08700.003312/2022-11.

[8] Inquérito Administrativo nº 08700.003341/2022-75.

[9] Procedimento Administrativo para Apuração de Ato de Concentração nº 08700.005459/2019-32.

[10] Processo Administrativo nº 08700.004248/2019-82.

[11] Segundo apontado no acordo de leniência, as empresas participantes da conduta seriam (i) Bueno Engenharia e Construção Ltda. (“Bueno”), (ii) Cotrans Locação de Veículos Ltda. (“Cotrans”), (iii) Delta Construções Ltda. (“Delta”), (iv) J. Malucelli Equipamentos Ltda. (“J. Malucelli”), (v) Ouro Verde Locação e Serviço S.A. (“Ouro Verde”), (vi) Paviservice Engenharia e Serviços Ltda. (“Paviservice”), e (vii) Terra Brasil Terraplanagem Ltda. – ME (“Terra Brasil”), bem como demais funcionários e ex-funcionários.

[12] Recursos Voluntários nº 08700.007547/2022-74 e 08700.005936/2022-65, referentes ao Inquérito Administrativo nº 08700.001992/2022-21.

[13] A AJDC representa a Heineken nesse processo. Note-se que as descrições aqui refletem apenas da visão do escritório sobre decisões do CADE.

[14] Vide relato da medida preventiva no Boletim AJDC 209.