200ª e 201ª Sessões Ordinárias do Tribunal do CADE, realizadas em 03 e 17 agosto de 2022. 3ª Sessão Extraordinária do Tribunal do CADE, realizada em 30 de agosto de 2022.
Pautas, atas e áudio da sessão disponíveis em https://www.gov.br/cade/pt-br

 

Destaques do CADE

SG instaura investigação para apurar desabastecimento de medicamentos

A Superintendência-Geral decidiu instaurar investigação[1], a pedido do Ministério da Saúde (MS), para apurar possíveis condutas anticompetitivas que estariam resultando em risco de desabastecimento no mercado nacional de medicamentos.

Segundo denúncia apresentada pelo MS, diversos conselhos estaduais e secretarias municipais relataram dificuldade na aquisição de medicamentos e potenciais riscos de desabastecimento. Nesse sentido, o MS decidiu articular ações para mitigar tais riscos, como reuniões com entidades farmacêuticas, troca de informações com demais entidades púbicas e reuniões com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) e o próprio CADE, a fim de se discutir a cadeia de distribuição do setor. Segundo o MS, contudo, embora muitas empresas farmacêuticas tenham alegado que diversos medicamentos estão em situação normal de produção e abastecimento, o MS tomou conhecimento, em sede de audiência pública, de possíveis problemas na cadeia de distribuição desses produtos.

Dessa forma, o MS entendeu ser necessário que o CADE apure potenciais práticas anticompetitivas na cadeia de distribuição de medicamentes, possivelmente responsáveis por riscos de desabastecimento no mercado nacional. A SG instaurou procedimento preparatório para analisar se existem indícios de infração à ordem econômica.

 

SG instaura investigação por suposta criação de dificuldades ao Correio Braziliense

A SG instaurou investigação[2] para apurar suposta criação de dificuldades, pelas empresas Metrópoles Mídia Digital Ltda. (Metrópoles), Pentágono S/A – Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários (Agente Fiduciário), Banco de Brasília S/A (BRB), BRB Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários e Casaforte Construções e Incorporações SPE S.A. (Casaforte), ao funcionamento da Correio Braziliense (Correio Braziliense).

Segundo representação apresentada pelo Correio Braziliense, a empresa emitiu debêntures em 2016 no valor de R$ 52 milhões, tendo oferecido como uma das garantias seu imóvel sede. Ademais, embora tenha se tornado inadimplente durante a pandemia ocasionada pela Covid-19, o Correio Braziliense alega que renegociou a dívida com o principal debenturista, o BRB, bem como anulou na justiça tentativa irregular de leilão do imóvel. Ocorre que, logo após, a empresa tomou conhecimento de que as debêntures do BRB, representativas de 80,77% das emissões, haviam sido adquiridas com deságio de 30% pela Casaforte, empresa do grupo concorrente Metrópoles. Segundo o Correio Braziliense, tal aquisição seria anticompetitiva, pois garantiria controle sobre ativos essenciais que estão na iminência de serem leiloados, inclusive sobre os quais o Grupo Metrópoles já informou em noticiário o interesse na sua alienação. Ademais, a operação também permitiria acesso a informações concorrencialmente sensíveis disponibilizadas em documentos corporativos, por decorrência de deveres de divulgação de informações ao Agente Fiduciário, além de configurar gun jumping, já que transferiria ativos do Correio Braziliense ao Grupo Metrópoles sem apreciação do CADE.

Dessa forma, o Correio Braziliense solicitou investigação para apurar potenciais condutas anticompetitivas pelo Grupo Metrópoles e respectivos agentes econômicos envolvidos na operação, bem como adoção de medida preventiva para que a transferência das debêntures do BRB para o Grupo Metrópoles seja suspensa, que os agentes envolvidos se abstenham de convocar assembleia de debenturistas e que o Agente Fiduciário não compartilhe informações sensíveis do Correio Braziliense com a Metrópoles. A SG instaurou procedimento preparatório para analisar a representação.

 

SG instaura investigação e concede medida preventiva contra Conselhos de Classe de Odontologia por proibirem aceitação de cartões de desconto

 A SG instaurou Processo Administrativo[3] para apurar suposto abuso de poder fiscalizatório e regulamentar pelo Conselho Federal de Odontologia (CFO) e pelo Conselho Regional de Odontologia de Minas Gerais (CRO/MG), consistente na proibição de que clínicas de odontologia aceitem cartões de desconto, bem como concedeu medida preventiva para fazer cessar os efeitos da conduta.

A denúncia foi apresentada por uma clínica do município de Capelinha, Minas Gerais. Segundo a denunciante, o CRO/MG instaurou processo disciplinar em seu desfavor pelo fato de aceitar o “Cartão Mais Solidariedade”, um cartão que garante descontos em procedimentos odontológicos a partir de uma mensalidade fixa. Segundo a denunciante, a proibição de cartões de desconto restringiria a livre iniciativa e a livre concorrência por proibir meios alternativos de prestação de serviços odontológicos. Dessa forma, a denunciante requereu fosse instaurada investigação, bem como fosse concedida medida preventiva para fazer cessar os efeitos da conduta. O CFO e CRO/MG apresentaram manifestação alegando que o cartão de descontos promove propaganda irregular, aliciamento de clientela e concorrência desleal em face dos demais profissionais da classe odontológica que respeitam as previsões do Código de Ética de Odontologia, o que em última instância desvalorizaria a profissão. Ademais, o CFO e o CRO/MG alegaram que não estão sujeitos à fiscalização do CADE, já que não são agentes econômicos com atuação no mercado.

A SG, contudo, entendeu que existem indícios suficientes de infração à ordem econômica para instauração de Processo Administrativo. Segundo a SG, o CADE já possui entendimento pacificado de que conselhos de classe respondem por prejuízos à ordem econômica decorrentes do exercício abusivo de sua função regulamentar e fiscalizatória. No caso concreto, existiriam indícios de que o CFO editou normativo anticompetitivo no Código de Ética de Odontologia consistente na vedação à mercantilização, que por sua vez fundamentou a fiscalização abusiva pelo CRO/MG. Ademais, a SG não acatou o argumento de que a vedação à atividade mercantil busca proteger a dignidade do ofício. Segundo a SG, por viabilizarem o acesso à saúde a um preço mais barato, os cartões de desconto são uma alternativa às classes mais desfavorecidas e fortalecem o exercício da profissão.

Dessa forma, a SG decidiu instaurar Processo Administrativo, bem como concedeu medida preventiva para fazer cessar os efeitos da normativa anticompetitiva constante do Código de Ética de Odontologia e qualquer medida pelo CRO/MG que venha impedir a utilização de cartões de desconto.

 

SG instaura investigação contra Itaú por suposta alavancagem da ConectCar

A SG instaurou investigação[4] para apurar suposta alavancagem, por Banco Itaú Unibanco (Itaú) e Banco Itaucard S.A. (Itaucard), da ConectCar Soluções de Mobilidade Eletrônica S.A. (ConectCar) no mercado de meios de pagamento eletrônico via Identificação Automática de Veículos (AVI). A tecnologia AVI é utilizada para pagamento automático em pedágios, estacionamentos e, de forma crescente, para outras aplicações como combustíveis e refeições via drive-thru. A Conectcar é uma joint venture controlada conjuntamente pela Redecard S.A., pertencente ao grupo Itaú, e pela Portoseg S.A., uma subsidiária da Porto Seguro S.A., na qual o Grupo Itaú Unibanco detém participação de mais de 30%.

A denúncia foi apresentada pelo Centro de Gestão de Meios de Pagamentos Ltda. (Sem Parar), concorrente da ConectCar no mercado de AVI. Segundo o Sem Parar, a empresa tomou conhecimento de que o Grupo Itaú passou a ofertar os serviços da ConectCar a todos correntistas do Itaú e clientes Itaucard de forma gratuita e vitalícia (campanha Tag Itaú). Além de preocupações de compartilhamento de dados pessoais da ConectCar com o Grupo Itaú, o Sem Parar alega que a prática constitui uma espécie de venda casada de produtos, pois só é possível a partir de subsídios cruzados decorrentes dos mercados de serviços bancários e cartões de crédito, em que o Grupo Itaú detém participação de mercado significativa.

Em especial, o Sem Parar alega que, por meio da oferta gratuita dos serviços, o Grupo Itaú seria capaz de inviabilizar o crescimento de concorrentes por estrangular as margens de rendimento, dado que rivais não seriam capazes de replicar oferta similar. Dessa forma, o Sem Parar requereu investigação para apurar potencial abuso de poder econômico, pelo Grupo Itaú e Conectar, consistente na alavancagem deste último no mercado de tecnologia AVI, bem como a adoção de medida preventiva para fazer cessar a campanha Tag Itaú.

Segundo a SG, a denúncia apresentada pelo Sem Parar relata prática de competência do CADE e “há razoabilidade na estrutura das teorias do dano sugeridas. Entretanto, com relação aos “fortes indícios de compartilhamento e utilização de dados pessoais pela OSA e instituições financeiras do Grupo Itaú”, esta SG entende que não restaram claras as implicações danosas à concorrência decorrentes do maior acesso a informações por parte de ConectCar e Grupo Itaú”.

Ainda, em relação ao pedido de medida preventiva, a SG entendeu que a isenção de pagamento tem sido prática recorrente no setor, e segundo estimativas de mercado, a ConectCar não aparenta ter participação superior a 20% para se presumir posição dominante, enquanto o Sem Parar possui participação de mercado de cerca de 60%. Além disso, não existiria perigo de dano na demora da decisão, dado que o Sem Parar tem mantido sua posição no mercado e eventuais danos à concorrência precisam ser melhor analisados. Dessa forma, a SG decidiu instaurar investigação para apurar potenciais condutas no mercado de AVI praticadas pela Conectar e pelo Grupo Itaú, especialmente venda casada e possíveis subsídios cruzados, mas não concedeu a medida preventiva solicitada pelo Sem Parar.

 

SG não conhece operação envolvendo aquisição de empresa não operacional

A SG decidiu não conhecer operação[5] envolvendo a aquisição de participação societária, pela BBFH LLC. (BBFH), sobre a Jatobá Participações S.A. (Jatobá). A BBFH é uma holding do Grupo Brookfield, que atua em diversos setores, como imobiliário, de infraestrutura e energia. A Jatobá é uma empresa não operacional pertencente ao Grupo Arapar, que possui participação indireta em empresas dos setores agroindustrial, agrícola, pecuária e florestal.

Segundo as Requerentes, a operação foi notificada porque seus grupos econômicos preenchem os critérios de faturamento para notificação de atos de concentração. A SG, no entanto, decidiu não conhecer a operação, entendendo que não se trata de ato de concentração de notificação obrigatória. Isso porque a Jatobá seria uma empresa não operacional, de forma que aquisição de participação em seu capital não caracterizaria aquisição de participação sobre empresa em sentido jurídico, que “compreende a atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços”. Assim, não havendo atividade econômica (operacional ou potencial) desenvolvida pela Jatobá, a operação não deveria ser conhecida.

 


Destaques da Sessão de Julgamento

 

Tribunal condena cafeterias por cartel em licitações da Infraero

O Tribunal do CADE condenou, por unanimidade, cinco empresas[6] por formação de cartel em licitações promovidas pela Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) destinadas à contratação de serviços de cafetaria em diversos aeroportos brasileiros[7].

A investigação teve origem em 2017 a partir de uma denúncia apresentada pela Infraero, que apresentou indícios de que as empresas teriam agido em conluio para alocar licitações entre si por meio de apresentação de propostas de cobertura e estratégia de bloqueio em pregões presenciais realizados entre maio e novembro de 2014.

Segundo as conclusões da SG, ao menos 7 licitações teriam sido afetadas, referentes aos aeroportos de Florianópolis/SC, Recife/PE, Campo Grande/MS, São José dos Pinhais/PR, Maceió/AL, e Congonhas, em São Paulo/SP. Em especial, as provas do conluio seriam relacionadas a (i) existência de relações de parentesco e afinidade entre os sócios-administradores das empresas investigadas, (ii) proximidade entre a data de criação das empresas e as datas de realização dos leilões, (iii) erros de formatação e ortografia idênticos em documentos de empresas distintas, bem como (iv) similaridade dos valores apresentados pelas empresas.

Durante a 194ª Sessão Ordinária de Julgamento (SOJ), realizada em 13 de abril, o Conselheiro Relator Sérgio Ravagnani apresentou voto pela condenação das empresas. Segundo o Relator, os indícios apontados pela SG seriam suficientes para concluir que houve prática de cartel em licitações da Infraero, a partir de propostas de cobertura e estratégia de bloqueio.

O julgamento foi então suspenso em razão de pedido de vista do Conselheiro Gustavo Augusto de Lima, que apresentou em sessão posterior voto divergindo do Relator pelo arquivamento do processo em relação a uma pessoa física, quanto ao cálculo das multas de duas pessoas físicas e para aplicar sanção consistente na proibição de que os condenados possam licitar com a administração pública por um período de cinco anos, abatido o período de suspensão que eventualmente já tenha sido cumprido em razão de decisão da Infraero. Na 200ª SOJ, a maioria do Plenário acompanhou as divergências apresentadas pelo Conselheiro Gustavo Augusto de Lima. Com a condenação das empresas e pessoas físicas, as multas somam cerca de R$ 4,7 milhões.

 

Tribunal decide avocar joint-venture entre empresas do setor automobilístico

Na 200ª SOJ, o Tribunal do CADE homologou, por unanimidade, despacho do Conselheiro Gustavo Augusto Lima para avocar Ato de Concentração envolvendo a formação de uma joint-venture (JV), com sede na Alemanha, entre empresas do setor automotivo[8][9].

Segundo as Requerentes, a JV criará uma plataforma para possibilitar trocas de dados na cadeia produtiva do setor automotivo a partir de padrões e critérios estabelecidos no âmbito do Catena-X, um ecossistema aberto a terceiros baseado nos princípios do Gaia-X – por sua vez, um “framework” para gerenciamento de infraestruturas, dados e serviços – com foco na indústria automotiva. Além disso, plataforma disponibilizará acesso aos usuários por meio de um portal único, em que os agentes poderão ofertar aplicativos em um marketplace comum. Para as Requerentes, a operação será pró-competitiva, pois estruturará uma rede colaborativa, não-discriminatória e de livre acesso, com incremento de serviços ofertados no setor e aprimoramento da tomada de decisões.

Após analisar a operação, a SG decidiu aprová-la sem restrições, concluindo que não resultaria em sobreposições horizontais nem integrações verticais, dado que as empresas integrantes da joint-venture não possuem atividades de gerenciamento de dados e continuarão a operar de forma independente. Ainda, preocupações referentes a potencial fechamento de mercado poderiam ser afastadas, considerando o padrão não-discriminatório e de livre acesso da plataforma.

Durante 201ª SOJ, contudo, o Conselheiro Gustavo Augusto de Lima apresentou despacho pela avocação do Ato de Concentração. Segundo o Conselheiro, embora as Requerentes aleguem que a JV não permitirá troca de informações sensíveis entre concorrentes, não foram apresentados os mecanismos que evitariam tais trocas, nem instrumentos que permitiriam às autoridades antitruste monitorarem o compartilhamento das informações. Além disso, seria necessário aprofundar a análise da operação para verificar se se a formação da JV não resultará em risco de fechamento de mercado em face de empresas sediadas fora da Alemanha. O despacho do Conselheiro foi homologado por unanimidade.

 

Tribunal condena cartel de revenda e distribuição de gás de cozinha

O Tribunal do CADE condenou três empresas[10] e pessoas físicas a elas relacionadas por cartel nos mercados de revenda e distribuição de gás liquefeito de petróleo em botijões de 13 kg (GLP P13), utilizados principalmente como gás de cozinha, em Estados do Nordeste do Brasil[11].

A investigação teve início em 2009, após uma denúncia apresentada pela Agência Nacional de Petróleo apontar aumento desproporcional no valor do gás praticado à época e o fato de que 90% dos botijões de GLP P13 eram comercializados com o preço de R$ 35,00. Concomitante ao início da investigação, o Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado do Ministério Público da Paraíba (Gaeco/MP/PB) requisitou a instauração de inquérito policial e, logo após, deflagrou a “Operação Chama Azul”, em que se realizaram buscas e apreensões e interceptações telefônicas, além de prisões provisórias.

Durante a investigação, a SG celebrou Termo de Compromisso de Cessação (TCC) com as empresas Companhia Ultragaz S.A. (Ultragaz), Copagaz Distribuidora de Gás Ltda. (Copagaz), Liquigás Distribuidora S.A. (Liquigás) e Supergasbras Energia Ltda. (Supergasbras). Segundo a SG, os autos conteriam provas de formação de cartel pelas distribuidoras de gás, que seria facilitado pelo monitoramento pelos revendedoras. Além disso, existiriam indícios de que o Sindicato dos Revendedores de Combustíveis e Derivados de Petróleo do Interior da Paraíba (SINDIREV) teria realizado reuniões periódicas para facilitar o cartel, exercendo assim influência à conduta comercial uniforme.

Durante a 201ª SOJ, o Conselheiro Relator Luis Braido apresentou voto pela condenação das revendedoras e distribuidoras de GLP P13. Segundo o Relator, as condutas caracterizariam um cartel clássico operacionalizado em duas camadas. De um lado, as revendedoras teriam fixado preços de revenda, bem como monitorado e sancionado seu descumprimento ao menos desde junho de 2005 até 2010, quando da deflagração da Operação Chama Azul. De outro lado, as distribuidoras, além de fixado preços de revenda, teriam dividido o mercado por meio da alocação de revendedores a distribuidoras, assim como imposto restrições verticais como recusa de venda, discriminação e regulação artificial do mercado de distribuição de GLP P13.

Para o Conselheiro Relator, e-mails, telefonemas, fax, fotografias e outras provas reunidas comprovariam a existência do cartel. Em relação ao SINDIREV, contudo, embora existissem provas de contatos ilícitos entre as empresas na sede do sindicato, o Relator entendeu que não existia nenhuma prova de participação direta de membros do sindicato, de forma que não seria possível lhe atribuir responsabilidade. Os demais membros do Tribunal acompanharam o voto do Relator, à exceção dos Conselheiros Sérgio Ravagnani e Lenisa Prado, que se manifestaram pelo arquivamento em relação as pessoas físicas não administradoras, sem poderes de gestão para tomada de decisão à época dos fatos. As multas aplicadas totalizam mais de R$ 600 milhões.

 

Tribunal aprova sem restrições aquisição de direitos de exploração de marca consumada em 2011

O Tribunal do CADE aprovou, sem restrições, operação envolvendo a aquisição, pela Konrad Paraná Comércio de Caminhões Ltda. (Konrad), dos direitos de exploração da marca Motor Company Brasil (Ford) detidos pela Slaviero Cascavel Ltda. (Slaviero) na cidade de Cascavel/PR. A operação havia sido consumada em 2011[12], ainda na vigência da Lei nº 8.884/1994.

À época da operação, a Konrad era uma sociedade do Grupo Konrad, que atua na revenda de caminhões da marca Ford em Maringá (PR), enquanto a Slaviero era uma sociedade pertencente ao Grupo InterAlli, que atua em setores diversificados, como infraestrutura portuária, energia e agronegócio. A operação foi consumada ainda em 2011, quando o Grupo InterAlli passava por um processo de rescisão de contratos de exploração de marcas automotivas e decidiu ceder os direitos de exploração da marca Ford à Konrad, que passou a explorá-los imediatamente. A SG tomou conhecimento da operação por meio um Procedimento Administrativo para Apuração de Ato de Concentração (“APAC”)[13], em que busca averiguar operações não notificadas no setor automotivo. Segundo a SG, as Requerentes cumpriam o critério do faturamento e deveriam ter notificado a operação em até 15 dias úteis de sua consumação, conforme previsão da Lei 8.884/1994.

Uma vez notificada ao CADE em julho de 2022, a SG recomendou aprovar a operação sem restrições, dado que constituiria mera substituição de agente econômico responsável por explorar a marca Ford na região. Durante a 201ª SOJ, o Conselheiro Relator Victor Fernandes apresentou voto pela aprovação sem restrições da operação. O Relator destacou que não há limite temporal para avaliar operações sujeitas a notificação obrigatória ao CADE e que, no atual regime normativo, da Lei nº 12.529/2011, a ausência de notificação de operações ao CADE constitui infração permanente, de forma que a prescrição do poder punitivo pela infração ocorre somente após 5 anos do término de sua consumação. Por outro lado, o prazo para que o CADE aplique multa a empresas que deixaram de notificar operações na vigência da Lei nº 8.884/1994, como no caso, prescreveria em 5 anos contados da data em que a operação deveria ter sido notificada (i.e. 15 dias após sua consumação), dado que o atraso na notificação constitui infração instantânea. O voto do Relator foi seguido por unanimidade pelos demais membros do Tribunal.

 

Tribunal aprova aquisição da LafargeHolcim pela CSN sem restrições

 O Tribunal do CADE aprovou, por unanimidade, operação envolvendo a aquisição, pela CSN Cimentos S.A. (CSN Cimentos), de 100% do capital social da LafargeHolcim Brasil S.A. (LafargeHolcim)[14].

A CSN Cimentos é a unidade responsável pelas atividades no ramo de cimentos da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), empresa que atua na produção de aço. A LafargeHolcim é uma empresa integrante do Grupo Holcim, que atua na fabricação de cimento, concreto e agregados para construção civil. Como descrito pelas Requerentes, a operação resulta em sobreposição horizontal no mercado de cimentos, bem como integração vertical entre as atividades da CSN Cimentos no segmento de cimentos e as atividades da LafargeHolcim nos segmentos de concreto e de varejo de materiais para construção civil.

Durante a análise do caso, a Cimento Tupi S.A. – Em Recuperação Judicial (Tupi) se habilitou como terceira interessada. Segundo a Tupi, a operação geraria riscos de exercício de poder coordenado por gerar concentrações muito elevadas (próximas a 50%) em mercados regionais de cimento, setor marcado por histórico de colusão, e a CSN teria capacidade e incentivos para (i) restringir o acesso de concorrentes a escória de alto forno, material gerado no processo siderúrgico e utilizado como insumo na produção de cimento, e (ii) discriminar o acesso às linhas férreas controladas pela MRS, cujo bloco de controle é integrado pela CSN.

Após analisar os mercados impactados pela operação, a SG decidiu aprová-la sem restrições em março de 2022. Segundo a SG, embora o mercado de cimento conte com altas barreiras à entrada, existiria rivalidade significativa decorrente da capacidade ociosa de concorrentes, de forma que preocupações concorrenciais relacionadas à sobreposição horizontal no mercado de cimento poderiam ser afastadas. Já quanto às integrações verticais, as Requerentes não possuiriam capacidade ou incentivo para fechar mercados, pois o Grupo Holcim não teria participação superior a 30% nos mercados de concretagem e revenda de materiais para construção civil e suas compras de cimento não seriam representativas o suficiente para fazer com que a CSN deixasse de comercializar tal produto a terceiros. Além disso, não existiria risco de restrição ao fornecimento de escória de alo forno, dado que a CSN já consumia toda sua produção de forma cativa antes da operação. Por fim, a CSN não teria capacidade para discriminar o acesso de rivais a linhas férreas da MRS, posto que existem mecanismos regulatórios da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e instrumentos de governança previstos em documentos internos que inviabilizariam tal estratégia. A Tupi apresentou recurso, de forma que autos foram encaminhados ao Tribunal.

Durante a 201ª SOJ, o Conselheiro Relator Luis Braido apresentou voto pela aprovação da operação sem restrições. Segundo o Relator, além da rivalidade nos mercados regionais de cimento decorrente da significativa capacidade ociosa de concorrentes, cimenteiras de outras regiões também poderiam deslocar sua produção de forma a contestar eventual aumento de preço das Requerentes no cenário pós-operação. Além disso, o Conselheiro Relator reconheceu que o mercado de cimento é concentrado e marcado por um histórico negativo de colusão, essa realidade é largamente anterior à operação. Quanto a incentivos para discriminação no fornecimento de escória de alto forno, o Conselheiro destacou que a oferta total de escória disponível às cimenteiras depende das atividades no mercado de aço plano, sem nexo causal com a operação, e que, se não for vendida ou doada, o descarte da escória se torna custoso para siderúrgicas.

O voto do Conselheiro Relator foi seguido pelos demais membros do Tribunal. Assim, o Tribunal aprovou a operação sem restrições.

 

Tribunal aprova venda de refinaria da Petrobras com restrições

 O Tribunal do CADE aprovou, com restrições previstas em Acordo em Controle de Concentrações (ACC), operação envolvendo a aquisição, pela REAM Participações S.A. (REAM), da totalidade das ações representativas do capital social da Refinaria de Manaus S.A. que, no fechamento da operação, deterá os ativos da Refinaria Isaac Sabbá (Reman), atualmente subsidiária integral da Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras)[15].

A REAM é uma sociedade pertencente ao Grupo Atem, cujas atividades são voltadas aos ramos de combustíveis, logística rodoviária e fluvial e construção naval. A Petrobrás é uma empresa integrada do ramo de petroquímica, gás natural, transporte e energia elétrica. A operação faz parte de uma série de obrigações assumidas pela Petrobrás junto ao CADE para promover a entrada de novos agentes no setor de refino de petróleo, especialmente por meio do desinvestimento de parte de suas refinarias, dentre as quais a Reman[16].

Segundo a SG, a operação resultaria em integração vertical entre a atividade de refino de petróleo pela Reman e a atividade de distribuição de combustíveis líquidos pelo Grupo Atem. De outro lado, a operação não resultaria em sobreposição horizontal no mercado de terminais portuários na região de Manaus. Isso porque, segundo a SG, o píer do Grupo Atem na região seria considerado uma “base” pela regulação da Agência Nacional de Petróleo (ANP), mas não propriamente um terminal, dado que não possui armazenagem, mas apenas píeres de atracação. Nesse sentido, não seria pertinente analisar os terminais portuários como um mercado relevante em que há sobreposição horizontal.

Distribuidoras de combustíveis e GLP apresentaram manifestações como terceiras interessadas requerendo a reprovação da operação[17]. Segundo as terceiras interessadas, a operação geraria um monopólio privado na região, bem como aumentaria riscos de adoção de condutas discriminatórias ou de elevação de preços, pela Reman, em seu terminal aquaviário (TUP Reman), considerado um ativo essencial para o transporte de combustíveis líquidos e GLP. Para a SG, contudo, a operação não geraria preocupações concorrenciais, posto que haveria alternativas para as distribuidoras adquirirem combustíveis de outras fontes e haveria plano de expansão da produção da Reman, visando garantir o abastecimento da região. Além disso, distribuidoras não seriam dependentes do TUP Reman, uma vez que todo o combustível demandado que não é produzido pela Reman é comprado e entregue pela própria refinaria e investimentos em infraestrutura não são impeditivos. Com a aprovação da operação pela SG, as terceiras apresentaram recursos, levando o caso ao Tribunal do CADE.

Durante a 200ª Sessão Ordinária de Julgamento, a Conselheira Relatora Lenisa Prado apresentou voto pela aprovação da operação sem restrições. O Conselheiro Gustavo Augusto de Lima, contudo, pediu vista do caso para analisar proposta de Acordo em Controle de Concentrações (ACC) apresentado pelas Requerentes. Na 3ª Sessão Extraordinária de Julgamento, o Conselheiro Gustavo Augusto de Lima apresentou voto pela aprovação da operação condicionada ao cumprimento de ACC. Para o Conselheiro, haveria sobreposição horizontal no mercado de movimentação e armazenagem de granéis líquidos, no segmento de combustíveis, envolvendo as atividades dos terminais portuários da Reman e do Grupo Atem na região de Manaus. Além disso, a dimensão geográfica do mercado não deveria abranger toda a Região Norte, mas apenas a cidade de Manaus, dado que os terminais da Reman e do Grupo Atem seriam indispensáveis para internação de combustíveis na cidade e as empresas seriam capazes de aumentar o preço de tais produtos sem perder clientes. Segundo o Conselheiro, a concentração no mercado chegaria a 80%, sendo que o Grupo Atem controlaria 4 dos 5 píeres da região no cenário pós-operação. Como destacado pelo Conselheiro, as refinarias da região seriam dependentes desses terminais para movimentar o óleo cru, os combustíveis líquidos e os demais derivados necessários ao “blend” final do produto refinado.

A concentração do mercado de movimentação e armazenagem de granéis líquidos, por sua vez, seria agravada pela verticalização decorrente da operação, dado que a REAM passaria a operar os serviços portuários, o refino de combustíveis e a atividade de distribuição, segmento onde o Grupo Atem já possui participações de mercado relevantes no Estado do Amazonas (30-40% na distribuição de Gasolina “C” e 50-60% na distribuição de Diesel tipo “B”). Dessa forma, seriam necessários remédios capazes de aumentar a rivalidade no fornecimento primário de combustíveis e garantir o acesso eficiente aos terminais aquaviários. Assim, o Conselheiro votou pela aprovação da operação condicionada aos termos do ACC negociado, que compreende as seguintes obrigações:

• Oferecer os serviços de movimentação de gasolina e diesel de todos os tipos no TUP Reman, permitindo aos carregadores em geral o acesso aos serviços do terminal em condições não discriminatórias;
• Permitir que distribuidoras concorrentes efetuem conexão dutoviária das suas instalações até o TUP Reman, devendo garantir o direito de passagem dos referidos dutos e conexões por suas instalações;
• Abster-se de condicionar a oferta relativas às obrigações acima a cláusulas contratuais de exclusividade, de não competição, de ship-or-pay, de raio, a condições contratuais discriminatórias ou anti-isonômicas ou a qualquer outro termo ou condição que não esteja expressamente previsto no ACC;
• Garantir os serviços de movimentação e armazenagem por meio do terminal da Atem em caso de impossibilidade de movimentação pelo TUP Reman, ou durante o período necessário à conclusão de obras de conexão dutoviária;
• Promover a desverticalização de suas operações, devendo separar as operações da refinaria das operações do TUP Reman;
• Submeter-se a procedimentos de arbitragem;
• Submeter-se a monitoramento por trustee.

Além disso, o Conselheiro destacou que a operação do TUP Reman somente poderá ser assumida pela REAM após o cumprimento dos compromissos de desverticalização e da publicação de aprovação pelo CADE do nome do trustee de monitoramento. Até que a operação do TUP Reman seja assumida pela REAM, as Requerentes poderão iniciar procedimentos de transição por meio de um clean team. Por fim, o ACC terá prazo de 36 meses, mas as conexões dutoviárias que forem aprovadas em decorrência do ACC não poderão ser desfeitas nem interrompidas sem autorização da ANP e do CADE, e a desverticalização da operação do TUP Reman também não poderá ser desfeita sem autorização do CADE.

Os demais membros do Tribunal acompanharam o voto-vista do Conselheiro Gustavo Augusto. Dessa forma, a operação foi aprovada condicionada aos remédios previstos em ACC.


NOTAS
[1] Procedimento Preparatório nº 08700.005582/2022-59.
[2] Procedimento Preparatório nº 08700.006085/2022-78.
[3] Processo Administrativo nº 08700.002535/2020-91.
[4] Inquérito Administrativo nº 08700.001031/2022-16.
[5] Ato de Concentração nº 08700.004702/2022-09.
[6] Alimentare Serviços de Restaurante e Lanchonete Ltda., Ventana Manutenção e Serviços Ltda., Confraria André Ltda., Boa Viagem Cafeteria Ltda., Delícias da Vovó Ltda.
[7] Processo Administrativo nº 08700.007278/2015-17.
[8] As empresas que comporão a joint-venture serão as seguintes: BASF SE, BMW Holding B.V., Henkel AG & Co. KGaA, Mercedes-Benz AG, Robert Bosch GmbH, SAP SE, Schaeffler Invest GmbH, Siemens Industry Software GmbH, T-Systems International GmbH, Volkswagen AG, ZF Friedrichshafen AG.
[9] Ato de Concentração nº 08700.004293/2022-32.
[10] Nacional Gás Butano Distribuidora Ltda. (Nacional Gás Butano), Frazão Distribuidora de Gás Ltda. – EPP (Frazão Distribuidora de Gás) e Revendedora de Gás da Paraíba Ltda. – EPP (“Revendedora de Gás da Paraíba”).
[11] Processo Administrativo nº 08700.003067/2009-67.
[12] Ato de Concentração nº 08700.004989/2022-69.
[13] APAC nº 08700.005458/2019-98.
[14] Ato de Concentração nº 08700.006299/2021-63.
[15] Ato de Concentração nº 08700.006512/2021-37.
[16] TCC nº 08700.002715/2019-30.
[17] Raizen S.A., Distribuidora Equador de Produtos de Petróleo S.A., Ipiranga Produtos de Petróleo S.A., Sociedade Fogás Ltda.