193ª Sessão Ordinária do Tribunal do CADE, realizada em 23 de março de 2022. Pautas, atas e áudio da sessão disponíveis em https://www.gov.br/cade/pt-br

Destaques do CADE

 

Senado aprova nomeações para Superintendente-Geral, Conselheiros e Procuradora-Chefe do CADE

O Plenário do Senado Federal aprovou, entre os dias 06 e 07 de abril, as nomeações de (i) Juliana Domingues para o cargo de Procuradora-Chefe do CADE, (ii) Alexandre Barreto de Souza para o cargo de Superintendente-Geral do CADE, (iii) Victor Oliveira Fernandes para Conselheiro do CADE e (iv) Gustavo Freitas de Lima também para Conselheiro do CADE. Os nomes já haviam sido aprovados em sabatinas da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal.

Com a aprovação, Victor Oliveira Fernandes e Gustavo Freitas de Lima exercerão mandatos de quatro anos, ao passo que Alexandre Barreto e Juliana Domingues exercerão mandatos de dois anos, com possibilidade de recondução. Alexandre Barreto ocupou anteriormente o cargo de Presidente do CADE entre 2017 e 2021.

 

TCU arquiva representação sobre método de cálculo de multas e contribuições pecuniárias pelo CADE

O Plenário do Tribunal de Contas da União (“TCU”) decidiu arquivar representação[1] apresentada pelo Ministério Público junto ao TCU referente a suposta irregularidade na atuação do CADE decorrente da não aplicação de estimativas de vantagem auferida como piso mínimo para o cálculo de multas e de contribuições pecuniárias em Termos de Compromisso de Cessação (“TCC”).

Segundo a representação, o CADE teria estipulado multas e contribuições pecuniárias em valores inferiores à estimativa de vantagem auferida com ilícitos concorrenciais, o que violaria disposição expressa da legislação[2] e daria margem à subpunição de empresas. O CADE apresentou manifestação argumentando, dentre outros elementos, que o TCU não poderia questionar “o mérito jurisdicional de dosimetria das penalidades aplicadas pelo Cade, objeto de análise e controle legal por órgão do parquet especialmente dedicado para tal[3]. Além disso, o conceito de vantagem auferida seria indeterminado, e a metodologia de cálculo de multas pelo CADE (que servem como base para o cálculo de contribuições pecuniárias em TCCs) refletiria o aprendizado e amadurecimento institucional da autarquia a fim de garantir coerência e eficácia na aplicação da lei.

O Plenário do TCU decidiu, por maioria, arquivar a representação. Embora o Plenário tenha reconhecido sua competência para apurar decisões do CADE, já que se tratam de atos administrativos sujeitos a controle externo, o Plenário não constatou irregularidade na atuação da autarquia, dado que o conceito de vantagem auferida é indeterminado e admite interpretação caso a caso. Assim, como o CADE demonstrou a complexidade da matéria e as razões da consolidação de sua metodologia, eventual questionamento pelo TCU poderia colocar em risco a estabilidade da política concorrencial e a segurança jurídica dos agentes econômicos.


Destaques da Superintendência-Geral do CADE

 

SG instaura investigação contra Ambev por exclusividade com estabelecimentos estratégicos

A Superintendência-Geral do CADE (“SG”) converteu em Inquérito Administrativo[4] representação apresentada pela HNK BR Indústria de Bebidas Ltda. (“Heineken”) para apurar a adoção de exclusividade, pela Ambev S.A. (“Ambev”), com estabelecimentos estratégicos (PDVs Premium) do canal a frio, composto majoritariamente por bares, restaurantes e casas noturnas[5].

Segundo a Heineken, a Ambev estaria abusando de sua posição dominante no mercado de cervejas para fechar o acesso de rivais a pontos de venda estratégicos, localizados nos principais bairros das maiores cidades do país, frequentados por um público “formador de opinião” e, em regra, dotados de maior volume de venda e rentabilidade. Como argumentado pela Heineken, ao firmar acordos de exclusividade com PDVs Premium, a Ambev é capaz de limitar a distribuição de cervejas e retirar a capacidade de construção de marcas de rivais. Como resultado, o consumidor é prejudicado pela redução da variedade e pelo aumento dos preços de cervejas disponíveis.

Dessa forma, a Heineken solicitou a instauração de inquérito administrativo com imposição de medida preventiva para fazer cessar danos irreversíveis no mercado de cervejas. A Ambev foi notificada e apresentará sua manifestação sobre a representação.

 

SG arquiva investigação contra B3 por cobrança por dados do mercado financeiro

A SG decidiu arquivar investigação[6] iniciada após denúncia apresentada por pessoa física, segundo a qual a B3 S.A. – Brasil, Bolsa, Balcão (“B3”) estaria praticando cobrança abusiva para o fornecimento de informações do mercado financeiro a pessoas jurídicas que criam ferramentas para auxiliar investidores pessoas físicas em seus investimentos. Segundo a denúncia, tais dados seriam fornecidos pela B3, no passado, de maneira gratuita, mas a empresa teria começado a cobrar pelo fornecimento de informações após lançar sua própria ferramenta que fornece dados a pessoas físicas. Com isso, a B3 seria capaz de excluir ferramentas rivais do mercado.

Em resposta, a B3 argumentou que a alteração de sua política de divulgação de dados e a modernização de suas ferramentas foram motivadas por razões legítimas de facilitação de acesso a informações financeiras, assim como garantia de maior transparência e eficiência. Segundo a B3, essas alterações contaram com a participação da Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”), órgão responsável pela regulação do mercado financeiro, que realizou recomendações que foram acatadas. Ademais, a empresa manteve a gratuidade de dados que a legislação exige que sejam públicos, e passou a cobrar apenas por dados com valor agregado, que não seriam essenciais para a atividade de pessoas jurídicas que auxiliam investidores pessoas físicas.

Segundo a SG, “se a nova política de cobrança de dados por parte da B3 atende às normas da CVM, mantendo a gratuidade do acesso a dados regulatórios e cobrando apenas pelos dados especializados, com valor agregado decorrente da atuação de equipe de experts, não há que se falar em prejuízo à concorrência no mercado de ferramentas que oferecem informações do mercado financeiro para clientes pessoas físicas”[7]. Dessa forma, a SG concluiu que “constata-se não haver indícios de ocorrência de infração à ordem econômica por parte da Representada, não cabendo a atuação do Cade, mais especificamente, desta SG, em âmbito repressivo” e “não sendo as denúncias de competência do Cade, restaria o comando do art. 47 desta Lei nº 9.784, para encaminhar as denúncias à autoridade competente. Todavia […] tais denúncias já são do conhecimento e apuração por parte da CVM, órgão com competência para tal”. Assim, a SG determinou o arquivamento da investigação.

 

SG arquiva investigação contra SAP Brasil por suposto abuso de posição dominante no mercado de softwares de gestão empresarial

A SG decidiu arquivar investigação[8] aberta após representação da Waterfy Partners Participações S/A (“Waterfy”), que alegava a ocorrência de abuso de posição dominante, pela SAP Brasil Ltda. (“SAP Brasil”), no mercado de softwares de gestão empresarial.

Em síntese, a Waterfy acusava a SAP Brasil de abusar de seu poder de mercado conquistado no mercado de softwares back office (soluções responsáveis pelo suporte e funcionamento interno da empresa) com seu produto já consolidado SAP S/4 HANA para limitar a concorrência no mercado de softwares front office (soluções responsáveis pela prestação do serviço diretamente aos clientes da empresa), prejudicando assim a Waterfy e demais concorrentes. Segundo a Waterfy, a SAP Brasil estaria afirmando junto a clientes de seu software back office que não seria possível integrar suas bases de dados a sistemas de front office concorrentes, de forma que seria necessário adquirir seu produto front office (SAP S/4 HANA for Utilities). Como indício das condutas relatadas, a Waterfy alegou que a COPASA, empresa de saneamento de Minas Gerais, teria publicado edital de contratação para implementação do SAP S/4 HANA for Utilities, o que indicaria que o produto já teria sido comprado em acordo direto entre SAP Brasil e COPASA mediante justificativa de inexigibilidade de licitação, o que poderia ter sido motivado pelas afirmações de incompatibilidade entre o software de back office da SAP Brasil com softwares rivais.

Após investigar o caso, a SG concluiu que não havia indícios suficientes de infração à ordem econômica. Isso porque, em primeiro lugar, a análise de possível irregularidade na decisão pela contratação por inexigibilidade de licitação não constitui atribuição do CADE, mas dos tribunais de contas. Além disso, segundo a SG, não existiriam indícios suficientes de materialidade da conduta: a principal evidência apresentada, referente à contatação do SAP S/4 HANA for Utilities sem realização de licitação pela COPASA, não seria indício de infração à ordem econômica, uma vez que a contratação desse software havia sido recomendada por grupo de trabalho constituído pela COPASA para definir a melhor solução de software para a empresa, cuja decisão foi baseada em critérios técnicos, conforme comprovado por documentação apresentada pela COPASA. Assim, a SG determinou o arquivamento da investigação.


Destaques da Sessão de Julgamento

 

CADE condena cartel no mercado de resinas

O Tribunal do CADE condenou[9], por maioria, as empresas Royal Química Ltda. (“Royal Química”) e Cempre Conhecimento e Educação Empresarial & Editora Ltda. (“TCA Consultores”), assim como quatro pessoas físicas, por formação de cartel nos mercados de resinas para revestimentos e para compósitos. O processo teve origem a partir de acordo de leniência firmado por empresas do Grupo Reichhold. Segundo apurado pela SG, empresas do setor de resinas teriam trocado informações concorrencialmente sensíveis e fixado preços entre 2000 e 2014.

No caso de resinas de poliéster, utilizadas para caixas d’água e banheiras, as condutas teriam se intensificado quando uma das empresas do setor contratou curso da TCA Consultores, cujo tema se referia ao equilíbrio do mercado e neutralização da concorrência, a ser ministrado às empresas concorrentes. Conforme apurado pela SG, a TCA Consultores funcionava como uma facilitadora do cartel, ao fornecer espaço para troca de informações sensíveis entre concorrentes e monitorar o cumprimento do cartel. Já no caso das resinas fenólicas, utilizadas para incrementar a utilidade de produtos acabados, apenas duas empresas atuavam no mercado, o que teria facilitado a colusão. O cartel também teria afetado o mercado de resinas para revestimento alquídicas ao menos entre 2004 e 2012. Ao longo da investigação, diversas empresas firmaram TCCs com o CADE, apresentando evidências adicionais ao acordo de leniência, restando como empresas investigadas apenas a Royal Química e a TCA Consultores.

Durante a 192ª Sessão Ordinária de Julgamento, a Conselheira Relatora Lenisa Prado apresentou voto pela condenação da Royal Química e de seus respectivos funcionários, considerando as evidências de comunicação com concorrentes, participação em reuniões e divisão de mercado. Por outro lado, a Relatora votou pelo arquivamento em relação à TCA Consultores, dado que a própria empresa contratante do curso sobre equilíbrio do mercado e neutralização da concorrência teria informado que não havia discussões sobre preços durante as aulas e a TCA Consultores não possuiria interesse no cartel, dado que não atua no setor de resinas.

O Conselheiro Luiz Hoffmann apresentou voto divergente quanto à condenação da TCA Consultores. Segundo o Conselheiro, a empresa teria servido de ponto focal para a troca de informações entre os concorrentes, além de ter monitorado o cumprimento de acordos, de forma que deveria ser condenada pela infração de influência à conduta uniforme. Além disso, o Conselheiro argumentou que a investigação não estaria prescrita em relação à empresa porque, tratando-se de infração semelhante à prática tipificada como crime pela Lei nº 8.137/1990, o prazo prescricional da conduta de influência à conduta uniforme seria de 12 anos, período que não havia transcorrido entre a evidência mais recente de prática ilícita da empresa e o início do processo administrativo. Os demais membros do Tribunal acompanharam o voto de Hoffmann. Assim, o Tribunal condenou a Royal Química, por unanimidade, e a TCA Consultores, por maioria. As multas aplicadas alcançam cerca de R$ 46 milhões.

 

Tribunal condena cartel internacional no transporte marítimo de veículos

O Tribunal do CADE condenou[10], por maioria, a empresa Höegh Autoliners Holdings AS e uma pessoa física pela participação em cartel internacional no mercado de transporte marítimo de automóveis, que teria resultado em efeitos no Brasil.

O processo teve origem a partir de acordo de leniência firmado por Mitsui OSK Lines e Nissan Motor Car Carriers. Ao longo da instrução do feito, cinco empresas firmaram TCC com o CADE, corroborando as alegações apresentadas pela signatária da Leniência. Segundo apurado pela SG, executivos das empresas investigadas teriam trocado informações concorrencialmente sensíveis, além de terem celebrado acordos para fixar preços e condições comerciais, dividir mercado e aplicar sobretaxas internacionais. As condutas seriam comprovadas por trocas de e-mails, contatos telefônicos e evidências de reuniões presenciais.

Durante a 192ª SOJ, o Conselheiro Relator Luis Braido votou pela condenação das empresas Grimaldi Group SpA e Höegh Autoliners Holdings AS. Segundo o Relator, existiriam evidências suficientes do cartel e de seus efeitos negativos ao mercado brasileiro, consubstanciadas em mensagens eletrônicas, relatórios internos de empresas, pedidos de cotação, dentre outras.

Na 193ª SOJ, o Presidente do CADE Alexandre Cordeiro apresentou voto acompanhando o Relator, com divergência sobre a dosimetria das multas aplicáveis e quanto à condenação da Grimaldi Group SpA, dado que, segundo o Presidente, não haveria evidências suficientes para condenar a empresa. O Conselheiro Sérgio Ravagnani acompanhou o Relator, divergindo quanto à condenação de pessoa física. A Conselheira Lenisa Prado, por sua vez, votou pelo arquivamento em relação às empresas Grimaldi Group SpA e Höegh Autoliners Holdings AS. O Presidente fez então uso de voto de qualidade, formando maioria pelo arquivamento do caso em relação à Grimaldi Group SpA. A multa aplicada à Höegh Autoliners Holdings AS alcança cerca de R$ 26 milhões.


NOTAS

[1] TC 017.012/2020-1.

[2] Art. 85, § 2º, c/c art. 37, I, ambos da Lei 12.529/2011.

[3] Manifestação Prévia, peça 9, apresentada pelo CADE.

[4] Inquérito Administrativo nº 08700.001992/2022-21.

[5] Note-se que a AJDC representa a Heineken neste caso.

[6] Procedimento Preparatório nº 08700.004045/2019-96.

[7] Nota Técnica SG nº 12/2022/CGAA2/SGA1/SG/CADE.

[8] Procedimento Preparatório nº 08700.003048/2021-27.

[9] Processo Administrativo nº 08700.003718/2015-67.

[10] Processo Administrativo nº 08700.001094/2016-24.