188ª Sessão Ordinária do Tribunal do CADE realizada em 24 de novembro de 2021. Pautas, atas e áudio da sessão disponíveis em www.cade.gov.br

 

Destaques do Poder Legislativo

 

CAE do Senado aprova indicação de novo Conselheiro do CADE

A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal aprovou, no dia 01 de dezembro, a indicação do Procurador Federal Gustavo Augusto Freitas de Lima para exercer o cargo de Conselheiro do CADE. A indicação, no entanto, ainda precisa ser apreciada pelo Plenário do Senado Federal. Uma das posições de Conselheiro no Tribunal do CADE está vaga desde o término do mandato do ex-Conselheiro Mauricio Bandeira Maia, em 11 de julho.


Destaques da Superintendência-Geral do CADE

 

SG decide não conhecer parceria entre Votorantim Cimentos e Ambipar

A SG decidiu não conhecer Ato de Concentração1 envolvendo prorrogação de parceria comercial entre Votorantim Cimentos S.A. (“Votorantim Cimentos”) e Ambipar Environmental Solutions – Soluções Ambientais Ltda. (“Ambipar”) para prestação mútua de serviços. Em síntese, por meio da parceria, a Votorantim permite a utilização de seu forno de cimento para coprocessamento de resíduos coletados e transportados pela Ambipar junto aos seus clientes.

As partes notificaram a prorrogação de sua parceria ad cautelam, argumentando que não se tratava, na realidade, de contrato associativo de notificação obrigatória. Isso porque, segundo as partes, embora a prorrogação da parceria fizesse com que o acordo entre as empresas preenchesse o critério temporal para caracterização de contrato associativo (i.e. duração superior igual ou superior a 2 anos), os demais requisitos estabelecidos na Resolução nº 17/2016 do CADE não estariam preenchidos, uma vez que (i) as partes não seriam concorrentes no mercado relevante objeto da operação, (ii) o contrato não estabeleceria empreendimento comum para exploração de atividade econômica e (iii) não haveria compartilhamento de riscos e resultados entre as empresas.

A SG concordou com o entendimento das partes e reconheceu que sua parceria comercial não caracteriza contrato associativo de notificação obrigatória. Isso porque, primeiro, as partes de fato não são concorrentes no objeto do contrato, “uma vez que Ambitec atuará na prospecção de clientes e, em alguns casos, em etapas prévias à atividade de coprocessamento, que, por sua vez, será realizada pela VC [Votorantim Cimentos]”. Além disso, também não haveria formação de empreendimento comum para exploração de atividade econômica, dado que a parceria não prevê “arranjo de deliberação conjunta sobre a realização de transporte de resíduos e coprocessamento, havendo uma clara separação nas atribuições pertinentes a cada parte”. Por fim, a parceria também não resultaria em compartilhamento de riscos e resultados, já que as partes convencionaram uma forma de pagamento usual pela prestação de serviços, “não havendo qualquer compartilhamento de resultados ou compensação pelo risco de indisponibilidade temporária de serviços” [2]. Assim, a operação não foi conhecida.

 

SG instaura investigação de cartel internacional na indústria farmacêutica

A SG instaurou, em 18 de novembro, Processo Administrativo para apurar suposto cartel internacional no mercado de produção e distribuição de Escopolamina-n-BrometoButil (SnBB), com potenciais efeitos no Brasil [3]. O SnBB é um insumo para a produção de medicamentos antiespasmódicos.

De acordo com a SG [4], haveria “evidências robustas” de que sete farmacêuticas multinacionais [5] teriam formado cartel para (i) definir quantidades de comercialização; (ii) coordenar preços; e (iii) proteger territórios e clientes preferenciais contra entrantes. As condutas anticompetitivas teriam acontecido de 1989 a 2019, sendo implementadas por meio de contatos “sistemáticos, frequentes e formais” viabilizados por trocas de e-mails e reuniões. As empresas e pessoas físicas representadas serão notificadas para apresentar suas defesas no caso.


Destaques da Sessão de Julgamento

 

Tribunal rejeita aquisição da Plamed pela Hapvida após descumprimento de remédio estrutural

O Tribunal do CADE rejeitou, por maioria, a aquisição da carteira de beneficiários e outros ativos da Plamed Plano de Assistência Médica Ltda. (“Plamed”) pela Hapvida Assistência Médica Ltda. (“Hapvida”), após concluir que as partes não cumpriram Acordo em Controle de Concentrações (ACC) celebrado em fevereiro [6].

Em síntese, a operação foi notificada ao CADE em abril de 2020 e, após longa instrução, o CADE concluiu que a aquisição despertaria preocupações concorrenciais nos mercados de planos de saúde de determinados municípios de Sergipe. Na região de Aracajú, em especial, a operação levaria à formação de um duopólio. Assim, de forma a endereçar as preocupações concorrenciais identificadas, as partes negociaram com o CADE um pacote de remédios estruturais e comportamentais previstos em ACC. Em primeiro lugar, foi acordado que a Hapvida alienaria a um concorrente uma carteira de contratos com beneficiários de planos de saúde suficiente para reduzir a variação de concentração em municípios do “cluster” de Aracaju. Além disso, a Hapvida deveria manter os preços de seus planos de saúde em Aracaju por dois anos, sendo permitidos somente os reajustes estabelecidos pela ANS. Ainda, a empresa deveria oferecer aos beneficiários provenientes dos planos da Plamed a possibilidade de fazer a portabilidade para os planos correspondentes da Hapvida.

O pacote de remédios negociado pelas partes com o CADE estabelecia que a venda da carteira de beneficiários deveria ser concluída até 28 de julho. Contudo, em 22 de julho, as partes apresentaram um pedido de prorrogação de prazo, já que não teriam conseguido cumprir o plano de desinvestimento dentro do período pré-estabelecido. O Tribunal do CADE rejeitou o pedido naquela oportunidade e iniciou procedimento de análise de descumprimento do ACC, considerando que as partes não cumpriram com o remédio estrutural. Em seguida, as partes apresentaram defesa informando a identidade de um comprador potencial para a carteira de beneficiários e um calendário revisado para concluírem o desinvestimento.

No entanto, a maioria do Tribunal entendeu por maioria na Sessão de Julgamento de 24 de novembro que, embora as partes estivessem negociando com potencial comprador, elas falharam em justificar por que não cumpriram o prazo estabelecido para solicitar revisão do calendário de desinvestimento previamente negociado – nos termos do ACC, as partes deveriam apresentar pedido até 15 dias antes do prazo final, mas solicitaram a extensão de prazo para desinvestimento a apenas seis dias do fim do prazo. Além disso, a maioria do Tribunal entendeu que o comprador potencial não cumpria a exigência de que fosse “ao momento do desinvestimento, um rival efetivo, viável, ativo e de longo prazo”, já que se tratava de um entrante com presença limitada e rede credenciada reduzida. Assim, o Tribunal reconheceu o descumprimento do ACC com a consequente rejeição da operação. Ficaram vencidos o Presidente do CADE Alexandre Cordeiro e o Conselheiro Luiz Hoffmann, que votaram pelo deferimento do pedido de extensão de prazo e aprovação do potencial comprador.

 

Empresas de tecnologia de meios de pagamento reconhecem gun jumping e recolhem contribuição de R$ 6,8 milhões

Em 24 de novembro, FD do Brasil Soluções de Pagamentos (“FD do Brasil”) e Software Express Informática Ltda. (“Software Express”) firmaram acordo junto ao CADE para encerrar investigação de consumação de ato de concentração de notificação obrigatória antes de apreciação pelo CADE (“gun jumping”) [7]. Com o acordo, as empresas recolherão contribuição no montante de cerca de R$ 6,8 milhões.

A FD do Brasil é uma empresa do setor de tecnologia de pagamento e parte do grupo norte-americano First Data, enquanto a Software Express é uma empresa brasileira que opera no mesmo segmento. Em março de 2019, a FD do Brasil adquiriu a Software Express, consumando a operação em seguida. Meses depois, a FD do Brasil identificou que a operação deveria ter sido notificada ao CADE, já que as partes atingiam o critério legal de faturamento previsto na Lei 12.529/2011.

Após identificar que a operação deveria ter sido notificada, a FD do Brasil espontaneamente apresentou o ato de concentração em junho de 2020 [8]. De acordo com a empresa, ela não havia notificado a operação em 2019 devido a um equívoco contábil: as informações de faturamento obtido em 2018 disponíveis no momento da realização da operação haviam sido baseadas nos Princípios Contábeis Geralmente Aceitos nos Estados Unidos da América (Generally Accepted Accounting Principles – “US GAAP”), e indicavam que a empresa não atingira faturamento bruto de R$ 750 milhões naquele ano. No entanto, depois que uma auditora independente preparou o relatório contábil com base nas práticas contábeis brasileiras, emitidas pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (“BR GAAP”), a FD do Brasil verificou que havia, na realidade, atingido o critério de faturamento para tornar a operação obrigatória.

O Tribunal considerou, por unanimidade, que embora a FD do Brasil tenha demonstrado que de fato cometeu um equívoco contábil por aplicar o US GAAP para o cálculo de seu faturamento de 2018, a empresa deveria ser responsabilizada pela prática de gun jumping, já que “a observância das regras nacionais de contabilidade garante uniformidade na atuação das empresas perante o controle de estruturas do CADE, bem como a consistência no exame das operações pela autoridade. Assim, não há que se cogitar a aceitação do critério estrangeiro”. De qualquer maneira, o fato de que a empresa notificou espontaneamente a operação permitiu reduzir o valor de sua contribuição em 50%. Além disso, a apresentação de acordo pela empresa levou a uma redução adicional de 10% sobre a multa esperada.

 

Tribunal não conhece recurso voluntário da TotalPass e converte procedimento contra Gympass em inquérito

O Tribunal do CADE decidiu, por maioria, não conhecer Recurso Voluntário [9] interposto pela TotalPass Participações Ltda. (“TotalPass”) com o objetivo de obter do Tribunal a adoção de medida preventiva em face da GPBR Participações Ltda. (“Gympass”).

Em setembro de 2020, a TotalPass apresentou representação ao CADE alegando suposta adoção, pela Gympass, de cláusulas restritivas em contratos com sua rede credenciada de academias, incluindo obrigações de exclusividade e cláusulas de paridade (MFNs), que teriam como objetivo de dificultar a entrada de novas empresas no setor de plataformas digitais agregadoras de academias de ginástica, onde operam a Gympass e a TotalPass. Em sua representação, a TotalPass solicitou à SG a adoção de medida preventiva que determinasse imediatamente a cessação de práticas anticompetitivas pela Gympass, em especial a imposição de obrigações de exclusividade que atingiriam, segundo a TotalPass, 80% das academias brasileiras, impedindo-as de negociar com rivais da Gympass.

A SG instaurou Procedimento Preparatório em seguida à representação, mas não apreciou a medida preventiva solicitada pela representante, nem converteu o procedimento preparatório em inquérito administrativo desde então. Diante disso, a TotalPass apresentou Recurso Voluntário ao Tribunal do CADE, alegando que a demora em decidir sobre seu pedido de medida preventiva resultaria, na prática, em seu indeferimento tácito, e constituiria uma ilegalidade continuada e violação ao direito constitucional à duração razoável do processo, solicitando que o Tribunal deferisse, então, a medida preventiva solicitada anteriormente.

A maioria do Tribunal entendeu, conforme voto do Conselheiro Luiz Hoffmann, que a legislação não impõe prazo para apreciação de medida preventiva pela SG, de forma que o recurso voluntário não poderia ser conhecido por não preencher o requisito essencial de existência de decisão prévia sobre “adotar, negar, alterar ou revogar a medida preventiva”, nos termos do Regimento Interno do CADE. Assim, o Tribunal não poderia conhecer o recurso, sob pena de usurpar a competência da SG de examinar pedidos de medida preventiva em procedimentos que tramitam sob seus cuidados.

Por outro lado, o Tribunal entendeu que a manutenção do processo em fase de Procedimento Preparatório desde sua instauração era inadequada, dado que esse tipo processual visa apenas a apurar se a matéria discutida é de competência do Sistema Brasileiro de Defesa de Concorrência, o que já teria sido demonstrado pela representante. Assim, o procedimento deveria ser convertido em Inquérito Administrativo. Foram vencidas as Conselheiras Lenisa Prado e Paula Farani, que votaram pelo conhecimento do recurso e seu provimento, além de instauração de Processo Administrativo, por reconhecerem que as práticas da Gympass resultariam em fechamento de mercado contra rivais.

 

Tribunal decide avocar Ato de Concentração entre Sony e Globo

O Tribunal homologou, por maioria, despacho da Conselheira Lenisa Prado para avocar Ato de Concentração [10] envolvendo a aquisição, pela Sony Music Entertainment Brasil Ltda. (“Sony”), da Som Livre Ltda. (“Som Livre”), atualmente parte do Grupo Globo.

A operação resulta em sobreposição horizontal nos mercados de música gravada, edição musical e eventos musicais ao vivo, além de integração vertical entre os mercados de edição e gravação musical. A SG decidiu aprovar a aquisição sem restrições em 29 de outubro por considerar que, ainda que houvesse níveis de concentração significativos em alguns segmentos, a “atual conjuntura do mercado de música gravada torna improvável o exercício efetivo de poder de mercado” [11]. Em especial, segundo a SG, a Sony não teria capacidade para exercer poder de mercado pós-operação devido ao poder de barganha das DSPs (Digital Service Providers – empresas que ofertam conteúdo musical pela internet) e pela pressão de artistas que, enquanto agentes racionais, têm interesse em conseguir exposição no maior número possível de canais, e reagiriam a eventuais imposições de exclusividade pela Sony. Além disso, a SG destacou que, no cenário pós-operação, haverá duas gravadoras rivais de porte semelhante à Sony (Universal e Warner), além de artistas poderem, atualmente, produzir, gravar e distribuir suas próprias músicas de maneira direta.

Contudo, segundo a Conselheira Lenisa Prado, a premissa de comportamento racional dos artistas utilizada como fundamento para afastar preocupações pela SG poderia ser colocada em questão pela existência de poder de mercado e de portfólio detido pela Sony no cenário pós-operação, o que poderia viabilizar a imposição de contratos de exclusividade desfavoráveis aos artistas. No mesmo sentido, ainda que haja outras gravadoras de grande porte no mercado, a Sony receberia ganhos imediatos pela aquisição de um amplo catálogo de artistas nacionais que dificultariam a contestação de poder de mercado por rivais.

Assim, a Conselheira entendeu necessário “instruir o caso para angariar dados relacionados ao volume e aos valores dos contratos dos principais artistas em exclusividade com as Requerentes e observar o quanto isso significa dentro do mercado total, verificando quais parcelas do mercado se encontram abertas à contestação por rivais”, além de “verificar a percepção dos artistas sobre quais condições impostas pela SME seriam aceitas e se as demais gravadoras impõem efetiva rivalidade, capaz de mitigar a probabilidade do exercício abusivo da posição dominante formada pós-operação” [12]. A maioria do Tribunal homologou o pedido de avocação, ficando vencido o Conselheiro Luiz Hoffmann, que votou pela não homologação.

 

Tribunal rejeita avocação de operação no setor de plataformas de trabalho

O Tribunal não homologou, por maioria, Despacho da Conselheira Lenisa Prado pela avocação da aquisição da empresa SK Rental Locação de Equipamentos Ltda. (“SK Rental”) pela Mills Estruturas e Serviços de Engenharia S.A. (“Mills”) [13].

A operação resulta em sobreposição horizontal no setor de locação de plataformas de trabalho aéreo, equipamentos que oferecem soluções para trabalho em altura voltadas para diversos segmentos, como construção civil, incorporação imobiliária, etc. A SG decidiu aprovar a operação sem restrições em 02 de novembro [14] por entender que a aquisição não alteraria substancialmente as condições estruturais do mercado de locação de plataformas de trabalho aéreo, haveria rivalidade suficiente nesse mercado e as barreiras à entrada seriam baixas, de forma que eventual exercício de poder de mercado pela SK Rental seria improvável.

Segundo a Conselheira Lenisa Prado, no entanto, “Os testes de mercado não indicaram a entrada de nenhum player relevante no mercado nos últimos cinco anos, e a tendência que se observa é o aumento da concentração, empreendido principalmente pela Mills, que já é por uma larga margem o player dominante”. Além disso, a Conselheira afirmou que a SG não teria analisado a operação “sob o prisma da racionalidade dos agentes envolvidos”, dado que “parece bastante razoável supor que a Mills adquiriu a SK Rental justamente para absorver sua principal concorrente nos estados do Paraná e Santa Catarina” [15].

O entendimento da Conselheira Lenisa Prado foi acompanhado pela Conselheira Paula Farani e pelo Conselheiro Luis Brado. Entretanto, os Conselheiros Luiz Hoffmann e Sérgio Ravagnani e o Presidente do CADE votaram pela não homologação do pedido de avocação, por entenderem que a análise da SG havia sido detalhada o suficiente para afastar quaisquer preocupações concorrenciais. Assim, com o empate, o Presidente Alexandre Cordeiro fez uso do voto de qualidade pela não homologação da avocação.


NOTAS
[1] Ato de Concentração nº 08700.005589/2021-90.
[2] Ato de Concentração nº 08700.005589/2021-90
[3] Processo Administrativo nº 08700.004235/2021-28
[4] Vide Nota Técnica nº 106/2021/CGAA7/SGA2/SG/CADE
[5] As empresas investigadas são Alchem International Pvt Ltd., Vital Laboratories Pvt Ltd., Alkaloids Corporation, Alkaloids of Australia Pty Ltd, Boehringer Ingelheim Pharma GmbH & Co., Linnea AS e Transo-Pharm Handels-GmbH
[6] Ato de Concentração nº 08700.001846/2020-33
[7] Procedimento Administrativo para Apuração de Ato de Concentração nº 08700.002914/2020-81
[8] Ato de Concentração nº 08700.001846/2020-33
[9] Recurso Voluntário nº 08700.005875/2021-55
[10] Ato de Concentração nº 08700.002922/2021-17
[11] Vide Parecer nº 10/2021/CGAA4/SGA1/SG
[12] Vide Despacho Decisório nº 22/2021/GAB1/CADE
[13] Ato de Concentração nº 08700.002894/2021-20
[14] Vide Parecer nº 10/2021/CGAA3/SGA1/SG/CADE
[15] Vide Despacho Decisório nº 21/2021/GAB1/CADE