182ª Sessão Ordinária do Tribunal do CADE realizada em 18 de agosto de 2021. Pautas, atas e áudio da sessão disponíveis em www.cade.gov.br

 

Destaques do Poder Judiciário

 

TRF1 reconhece prescrição intercorrente e anula condenação contra Supergasbrás Energia

A Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) negou, por unanimidade, provimento a apelação do CADE em sentença anulatória de multa aplicada contra a Supergasbrás Energia Ltda.[1] A decisão do TRF-1 confirmou a sentença de Primeira Instância, que havia reconhecido a ocorrência de prescrição intercorrente do processo administrativo que tramitou perante o CADE.

Em síntese, a Supergasbrás apresentou ação judicial com o objetivo de suspender a exigibilidade e afastar multa imposta pelo CADE em processo administrativo que investigava formação de cartel na distribuição de GLP. O Juízo de Primeira Instância deferiu o pedido da Supergasbrás, afirmando que a prescrição intercorrente teria se materializado durante o trâmite do processo junto ao CADE. O CADE interpôs, então, apelação em face da decisão.

Em Acórdão recentemente publicado, o TFR1 manteve a decisão do Juízo de Primeira Instância, afirmando que a prescrição intercorrente teria se materializado porque, em um período superior a três anos, o único ato da administração pública teria sido a emissão de ofícios ao Ministério Público Federal (MPF) com solicitação de informações sobre Ação Civil Pública cujo objeto também era apuração de cartel na distribuição de GLP.

De fato, o TRF1 concluiu que “Simples despacho com solicitação de informações ao Ministério Público Federal sobre ao andamento processual de Ação Civil Pública, com objeto semelhante ao do processo administrativo, invocado como marco interruptivo do prazo prescricional, não configura ato com força de movimentação processual ou ato inequívoco que importe apuração do fato, de forma a afastar a inércia administrativa no caso concreto, notadamente em um contexto no qual o CADE atuava na ação civil pública na condição de amicus curiae”. Dessa forma, teria se materializado prescrição intercorrente do processo administrativo, sendo confirmada a sentença de Primeira Instância.

 

Destaques da Superintendência-Geral

 

SG inicia procedimento preparatório após representação da Waterfy contra a SAP Brasil

A Superintendência-Geral do CADE converteu em Procedimento Preparatório a Representação apresentada pela Waterfy Partners Participações S/A (“Waterfy”) contra a SAP Brasil Ltda. (“SAP Brasil”) para investigar supostos indícios de abuso de posição dominante nos mercados de softwares back office e front office.[2]

A Waterfy atua principalmente no desenvolvimento e licenciamento de programas de computador customizáveis, aplicáveis ao setor de saneamento, e atividades de gestão e operação de ativos de saneamento. A SAP Brasil, por sua vez, é conhecida pelo desenvolvimento de softwares ERP e atua no gerenciamento de experiência, na análise de dados e negócios de Empresas Inteligentes (“Intelligence Enterprise”). Segundo a Waterfy, as duas empresas são concorrentes no mercado de softwares front office de empresas de utilities, e a SAP Brasil deteria posição dominante no mercado de softwares back office.

Na representação, a Waterfy acusa a SAP Brasil de abusar de seu poder de mercado conquistado no mercado de softwares back office (soluções responsáveis pelo suporte e funcionamento interno da empresa) com seu produto já consolidado SAP S/4 HANA para limitar a concorrência no mercado de softwares front office (soluções responsáveis pela prestação do serviço diretamente aos clientes da empresa), prejudicando assim a Waterfy e demais concorrentes. Em síntese, segundo a Waterfy,  a SAP Brasil estaria afirmando junto a clientes de seu software back office que não seria possível integrar suas bases de dados a sistemas de front office concorrentes, de forma que seria necessário adquirir seu produto front office (SAP S/4 HANA for Utilities).

Segundo a Waterfy, essas informações seriam provavelmente falsas, visto que diversas empresas do mercado (SABESP, Iguá Saneamento e BRK Ambiental) utilizariam o SAP 4/4 HANA com sistema front office de concorrentes compatíveis. De qualquer maneira, a Waterfy argumenta que, caso a informação seja verdadeira e o software da SAP Brasil não possa ser integrado a softwares concorrentes, tratar-se-ia de prática anticompetitiva consistente na recusa injustificada de interoperabilidade entre softwares.

Como indício das condutas relatadas, a Waterfy alegou que a COPASA, empresa de saneamento de Minas Gerais, teria publicado edital de contratação para implementação do SAP S/4 HANA for Utilities, o que indicaria que o produto já teria sido comprado em acordo direto entre SAP Brasil e COPASA mediante justificativa de inexigibilidade de licitação, o que poderia ter sido motivado pelas afirmações de incompatibilidade entre o software de back office da SAP Brasil com softwares rivais. Nesse sentido, a Waterfy e outras concorrentes estariam sendo privadas da oportunidade de participar em licitações em razão das condutas atribuídas à SAP Brasil, caracterizando fechamento de mercado.

Dessa forma, a Waterfy solicitou a instauração de inquérito administrativo com imposição de medida preventiva visando impedir a SAP Brasil de ofertar a clientes públicos softwares front office sem atender a processo licitatório sob o fundamento de inexigibilidade de licitação.

 

SG não conhece operação envolvendo empresas do Sistema Unimed

A Superintendência-Geral decidiu pelo não conhecimento de operação envolvendo a aquisição da carteira de beneficiários de planos privados de assistência à saúde da Unimed Planalto pela Central Nacional Unimed (CNU).[3]  Ambas as Requerentes são cooperativas médicas integrantes do Sistema Cooperativo Unimed (“Sistema Unimed”).

Segundo Parecer da SG, a operação se enquadra, a princípio, como ato de concentração, e as Requerentes, consideradas separadamente, atenderiam aos critérios de faturamento previstos na Lei nº 12.529/2011 caracterização de para notificação obrigatória. Entretanto, a SG identificou que, apesar de cada cooperativa possuir gestão e capacidade financeira independente (em geral, as entidades do Sistema Unimed não possuem participação societária entre si), as decisões estratégicas que envolvem o Sistema Unimed são centralizadas na confederação Unimed do Brasil, que é responsável por deliberar quanto ao uso do nome e da marca Unimed, bem como decidir sobre criação e permanência de cooperativas de qualquer grau do Sistema Unimed e uniformizar nacionalmente os procedimentos e rotinas. Em especial, a Unimed do Brasil coordena o compartilhamento da rede credenciada e segmenta as cooperativas geograficamente, de forma que as Unimeds Singulares, por atuarem em mercados geográficos diferentes, não competem entre si por beneficiários.

Assim, seria necessário analisar se Unimed Planalto e CNU não seriam, n realidade, parte de um mesmo grupo econômico, posto estarem sob controle externo da Unimed do Brasil. A SG destacou que, para caracterizar exercício de controle externo, seria preciso verificar (i) atuação como entidade econômica única, com definição de estratégias de negócio e apresentação perante o mercado como único agente e (ii) existência de relação de subordinação e dependência entre empresas.

Analisando o caso, a SG concluiu que as normas referentes à organização do Sistema Unimed indicam que a Unimed do Brasil de fato exerce certo nível de controle externo sobre a atuação das diferentes Unimeds, especialmente pela limitação das áreas geográficas atendidas por cada unidade. Assim, a SG decidiu não conhecer a operação, dado que as requerentes seriam, na realidade, parte de um mesmo grupo econômico.

 

Destaques da Sessão de Julgamento

 

Tribunal condena cartel em licitações de materiais escolares de Pernambuco

O Tribunal do CADE condenou, por unanimidade, dez empresas e cinco pessoas físicas em processo que investigou prática de cartel em licitações públicas para aquisição de material escolar e de escritório por prefeituras municipais de Pernambuco.[4] O processo foi instaurado em 2016 a partir de representação enviada pela Superintendência Regional da Polícia Federal no Estado do Pernambuco. A PF em Pernambuco reuniu diversas provas do acordo, incluindo diálogos obtidos por meio de interceptações telefônicas e documentos apreendidos em diligências de busca e apreensão decorrentes da “Operação Invictus”.

O Conselheiro Relator Luiz Hoffmann entendeu que os envolvidos no cartel dividiram o mercado, segmentando áreas de atuação e licitações, combinaram preços e trocaram informações concorrencialmente sensíveis para fraudar o caráter competitivo de certames públicos. Também teria feito parte da estratégia colusiva o pagamento de comissões entre as empresas participantes do ilícito, com a emissão de cheques, como forma de compensar vitórias nos procedimentos.

Enquanto a decisão pela condenação dos representados foi tomada por unanimidade, houve divergência no Tribunal quanto à dosimetria das multas. Por um lado, o Conselheiro Relator propôs cálculo baseado em porcentagem do faturamento bruto no exercício anterior à instauração do processo administrativo, no ramo de atividade empresarial em que ocorreu a infração. O Conselheiro Sérgio Ravagnani, por sua vez, apresentou voto-vista pela aplicação de multas mínimas correspondentes à estimativa de vantagem auferida pelos representados, sugerindo como cálculo a aplicação de um percentual de 20% (presunção relativa de sobrepreço) sobre o preço dos contratos negociados no âmbito do cartel, atualizados pela SELIC – racional similar ao proposto pela Conselheira Paula Azevedo no processo administrativo que julgou o cartel em licitações de uniformes e material escolar no Estado de São Paulo, na 179ª Sessão Ordinária do Tribunal do CADE.[5]

O Conselheiro Ravagnani foi acompanhado pelos Conselheiros Luis Braido, Paula Azevedo e Lenisa Prado, restando vencidos quanto à dosimetria de cálculo o Conselheiro Relator, o Presidente Alexandre Barreto e o Conselheiro Mauricio Maia (os dois últimos já haviam votado antes do término de seus mandatos). Assim, multas com base no cálculo de vantagem auferida foram aplicadas aos representados quando seus valores foram superiores às propostas pelo Conselheiro Relator.

Além das multas, o Tribunal determinou, por maioria, penalidades acessórias, como proibição de contratar com instituições financeiras oficiais e de participar de licitações promovidas pela Administração Pública Federal, Estadual, Municipal e do Distrito Federal, bem como em entidades da administração indireta, pelo prazo de cinco anos. Às pessoas físicas, determinou ainda, pelo mesmo período, a proibição de exercer o comércio em nome próprio ou como representante de pessoa jurídica.


NOTAS
[1] Apelação Cível nº 0020106-75.2015.4.01.3400.
[2] Procedimento Preparatório nº 08700.003048/2021-27.
[3] Ato de Concentração nº 08700.003747/2021-77.
[4] Processo Administrativo n° 08700.004455/2016-94.
[5] Processo Administrativo nº 08700.008612/2012-15.