178ª Sessão Ordinária do Tribunal do CADE realizada em 26 de maio de 2021. Pautas, atas e áudio da Sessão disponíveis em www.cade.gov.br

 

Destaques do CADE

 

CADE firma acordo de cooperação com a ANPD

O CADE e a Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD) firmaram Acordo de Cooperação Técnica com o objetivo de estabelecer as diretrizes para atuação conjunta em casos que envolvam proteção à concorrência e dados pessoais[1]. Em síntese, as autoridades se comprometem a compartilhar documentos, informações e experiências em suas áreas de atuação, além de promover o aperfeiçoamento de quadros técnicos e produzir estudos e pesquisas em conjunto.

Na ocasião, o CADE também lançou o estudo “Benchmarking internacional sobre as instituições de Defesa da Concorrência e Proteção de Dados”. O documento apresenta um panorama sobre a estrutura, as funções e a relação entre autoridades de defesa da concorrência e de proteção de dados de doze jurisdições, além de traçar considerações gerais sobre possíveis aprendizados para o CADE e para a ANPD.

O estudo conclui que a proteção de dados impactou não somente a análise de casos concretos em jurisdições estrangeiras, mas também provocou mudanças legislativas, mudanças em critérios para análise antitruste ou mesmo a criação de novos setores dentro do órgão antitruste, e destaca que “a defesa da concorrência, a proteção de dados e a proteção do consumidor estão cada vez mais interligadas. O documento pode ser acessado na íntegra aqui.

 

 

Destaques da Superintendência-Geral

 

SG não conhece contrato de aquisição entre YPFB e TBG

A Superintendência-Geral decidiu não conhecer operação que tratou de exercício do direito de preferência da YPFB Transporte do Brasil Holding Ltda. (“YPFB”) para a aquisição de participação acionária na Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil S.A. (“TBG”)[2].

Em síntese, as Requerentes notificaram a operação ao CADE por entender que os grupos comprador e vendedor alcançavam os parâmetros legais de faturamento obtido no ano anterior à operação. De fato, a SG verificou que o Grupo Fluxys, vendedor, registrou faturamento bruto acima de R$ 750 milhões no ano anterior à operação. No entanto, a YPFB, compradora, não registrou qualquer receita no Brasil. As Requerentes entenderam que, para essa empresa, o “faturamento bruto” para fins de determinação da obrigatoriedade de notificação ao CADE seria equivalente aos dividendos registrados como Resultado de Equivalência Patrimonial, método que atualiza o valor contábil do investimento em determinada empresa ao valor equivalente à participação societária da sociedade investidora no patrimônio líquido da sociedade investida, e que superaria R$ 75 milhões.

A SG afirmou, no entanto, que o Resultado de Equivalência Patrimonial não é considerado pelo CADE como substituto ou equivalente ao faturamento bruto propriamente dito. Como ressaltou a SG, “para fins de contabilização de faturamento bruto, deve-se considerar a receita bruta ou receita operacional bruta”. Assim, dado que o grupo econômico da YPFB não compreende nenhuma outra empresa que tivesse registrado faturamento bruto superior a R$ 75 milhões no Brasil no ano anterior à operação, o ato de concentração não foi conhecido.

 

 

Destaques da Sessão de Julgamento

 

Tribunal aprova TCCs com ZF do Brasil e Andrade Gutierrez

O Tribunal do CADE decidiu, por maioria, homologar Termo de Compromisso de Cessação (TCC) proposto por ZF do Brasil Ltda., ZF Friedrichshafen AG, ZF Sachs AG e pessoas físicas em relação a Processo Administrativo que apura a ocorrência de suposto cartel nos mercados nacional e internacional de embreagens[3]. Com a assinatura do TCC, os compromissários reconhecem a participação na conduta ilícita, se comprometem a cessar a prática e a colaborar com a investigação, além de contribuir com o pagamento conjunto de cerca de R$ 21 milhões. Os Conselheiros Sérgio Ravagnani e Luis Braido, vencidos, votaram contra a homologação do TCC por considerarem que a contribuição pecuniária seria insuficiente.

O Tribunal também homologou, por maioria, TCC firmado entre o CADE e Andrade Gutierrez Engenharia e uma pessoa física, relacionado a inquérito administrativo que apura suposto cartel no mercado de obras civis de infraestrutura de aeroportos em licitações públicas realizadas pela Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), caso relacionado à Lava Jato[4]. O TCC, primeiro celebrado na investigação, contempla cláusulas de admissão de participação na conduta investigada e colaboração com provas. Os signatários deverão pagar contribuição pecuniária de R$ 11,6 milhões ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos. O Conselheiro Luis Braido votou contra a aprovação do TCC por entender que o valor da contribuição seria muito baixo.

 

Tribunal condena cartel de empresas de manutenção predial

O Tribunal do CADE decidiu, por maioria, condenar duas empresas e quatro pessoas físicas por formação de cartel no mercado de serviços de manutenção predial[5]. A investigação havia sido instaurada a partir do desmembramento de outro processo nesse mercado, julgado pelo Tribunal do CADE em agosto de 2017[6].

Conforme a maioria do Tribunal, que acompanhou o voto do Conselheiro Luiz Hoffmann, as evidências reunidas pela SG, que incluem trocas de e-mails entre concorrentes e anotações manuscritas de terceiros obtidas mediante busca e apreensão, TCCs e Acordo de Leniência, demonstrariam que as empresas Hersa Engenharia e Serviços Ltda. e Vivante S/A combinaram com seus concorrentes os valores das propostas a serem apresentadas em licitações públicas e privadas, simulando a existência de competição por meio de propostas fictícias ou de cobertura. Por outro lado, o processo foi arquivado em relação a outras nove empresas e cinco pessoas físicas por insuficiência de provas de envolvimento em conduta anticompetitiva.

O Tribunal divergiu, em especial, quanto à ocorrência de prescrição intercorrente no caso. A Conselheira Relatora Lenisa Prado, que restou vencida, sustentou que o processo deveria ser arquivado devido à ocorrência de prescrição intercorrente porque os atos realizados pela SG no período entre 29 de julho de 2011 e 30 de julho de 2014 não constituiriam atos interruptivos de prescrição por se tratarem de atos de mero expediente e burocráticos. Esses atos foram: (i) recebimento de informando sobre decisão judicial relacionada ao Processo Administrativo em análise; (ii) juntada da decisão judicial que revogava o impedimento parcial de utilização de provas no processo; (iii) despacho de tramitação interna do processo; (iv) listas de presença de reunião das autoridades com os representantes das partes investigadas.

Segundo a maioria do Tribunal, entretanto, reuniões com os Representados em abril de 2012, julho e dezembro de 2013, além de notificação por via postal dos Representados sobre instauração de averiguação preliminar em agosto de 2011 constituiriam atos instrutórios capazes de interromper o prazo prescricional. Assim, não teria havido prescrição intercorrente. As multas aplicadas pelo Tribunal aos Representados totalizaram cerca de R$ 10,6 milhões.

 

Tribunal arquiva investigação de suposto cartel de empresas de saneamento

O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, arquivar investigação de cartel em licitações públicas na área de emissão de faturas de água e esgoto e outros serviços no período de 2004 a 2012, nos termos do voto do Conselheiro Relator Luis Braido[7]. A investigação havia sido iniciada a partir de inquérito policial em trâmite no município de Sorocaba/SP.

Em síntese, decisões judiciais declararam nulas as interceptações telefônicas realizadas durante a denominada operação “Águas Claras” devido à ausência de fundamentação adequada para a realização das interceptações. Como resultado, a totalidade da apuração ocorrida na ação penal foi declarada nula com base na “teoria dos frutos da árvore envenenada”.

A anulação das provas oriundas da ação penal, embora não resultasse em nulidade de todos os documentos colhidos pela SG, já que parte deles havia sido obtida por fontes independentes e poderia, portanto, ser utilizada pelo CADE, tornava o conjunto probatório insuficiente para a condenação das Representadas. Assim, o processo acabou arquivado.

 

Tribunal rejeita avocação de contrato associativo entre Claro e Serasa

Durante a Sessão, quatro avocações de atos de concentração solicitadas pela Conselheira Lenisa Prado foram levadas a julgamento. Os casos tratavam de operações envolvendo American Tower/Telxius[8], Rede D’Or/Hospital América[9], Smartfit/Just Fit[10] e Claro/Serasa[11], todas aprovadas sem restrições pela SG.

Com relação às três primeiras operações, a Conselheira Lenisa Prado apresentou votos reconsiderando seus despachos de avocação, afirmando que esclarecimentos prestados pelas partes antes da Sessão haviam sido suficientes para o esclarecimento das questões concorrenciais anteriormente identificadas, votando pela manutenção das aprovações desses casos pela SG. O Tribunal confirmou a não homologação desses despachos por unanimidade.

Restou sob exame, portanto, o pedido de avocação da operação Claro/Serasa. Em síntese, a operação trata de celebração de contrato por meio da qual a Claro fornecerá dados dos usuários de seus serviços para a Serasa, que desenvolverá, por sua vez, tecnologias que agreguem valor aos dados da Claro. A operação foi conhecida como notificação e contrato associativo e aprovada sem restrições pela SG, que também negou habilitação da Boa Vista SPC como terceira interessada. Para a SG, não haveria risco de fechamento de mercado para bureaux de crédito que concorrem com a Serasa, dado que (i) informações semelhantes às que a Claro irá passar para a Serasa podem ser obtidas de diversos outros players do mercado, (ii) o contrato mantém a independência das Requerentes na oferta de produtos e serviços em seus respectivos mercados e (iii) o contrato viabiliza a oferta ao mercado de novos produtos e serviços, que terão sua qualidade aprimorada.

A Conselheira Lenisa Prado requereu a avocação do caso por entender que, em primeiro lugar, o interesse da Boa Vista em se habilitar no processo como terceira interessada foi indevidamente negado pela SG. Além disso, a Conselheira argumentou que a operação deveria ser analisada como joint venture contratual, e não como contrato associativo. Por fim, a Conselheira afirmou ser necessário aprofundar a análise do risco de fechamento de mercado, já que “A afirmação simplista de que os dados fornecidos pela Claro podem ser obtidos por outros bureaux por outras formas, e que atualmente ela não fornece os dados objetos da parceria para nenhum outro bureau, desconsidera questões importantes do ponto de vista concorrencial.” Em especial, para a Conselheira, a “parceria daria a vantagem competitiva do pioneiro para a Serasa (que já detém provável posição dominante), em uma estrutura de mercado que pode funcionar como uma plataforma (com potencial negative feedback loop) em relação a um insumo valioso (os dados), que pode fortalecer as características de the winner takes all do mercado de plataforma”.

Em julgamento, o pedido de avocação foi rejeitado pela maioria do Tribunal. Em resumo, a maioria entendeu que a SG havia realizado uma análise detalhada e suficiente para sua decisão de aprovar a operação sem restrições. De fato, a maioria do Tribunal destacou que os dados a serem fornecidos pela Claro não seriam estratégicos a ponto de serem necessários para atuação dos bureaux de crédito, tendo em vista que representam parcela não substancial do mercado e poderiam ser obtidos de outras bases de dados cadastrais, Além disso, a questão sobre o enquadramento da operação como contrato associativo ou joint venture contratual foi afastada porque não traria impacto sobre a decisão do CADE, já que, em qualquer caso, o contrato deveria ser conhecido pela SG. Por fim, a maioria destacou que, ainda que a participação da Boa-Vista como terceira interessada no Ato de Concentração tenha sido indeferida, a SG analisou e afastou as preocupações apresentadas pela empresa. Dessa forma, a decisão da SG foi mantida pelo Tribunal, e a decisão foi encaminhada à ANPD e à ANATEL para ciência da operação.


NOTAS
[1] Acordo de Cooperação Técnica nº 05/2021 no Processo nº 08700.002088/2021-51.
[2] Ato de Concentração nº 08700.002043/2021-87.
[3] Processo Administrativo nº 08700.000881/2019-00.
[4] Inquérito Administrativo nº 08700.003252/2017-61.
[5] Processo Administrativo n° 08012.005024/2011-99.
[6] Processo Administrativo nº 08012.006130/2006-22.
[7] Processo Administrativo n° 08700.001885/2017-35.
[8] Ato de Concentração nº 08700.000821/2021-01.
[9] Ato de Concentração nº 08700.000167/2021-28.
[10] Ato de Concentração nº 08700.001312/2021-98.
[11] Ato de Concentração nº 08700.006373/2020-61.