173ª Sessão Ordinária do Tribunal do CADE realizada em 10 de março de 2021. Pautas, atas e áudio da Sessão disponíveis em www.cade.gov.br

 

Destaques do CADE

 

CADE divulga versão em inglês do Guia H

O CADE lançou versão em inglês de seu Guia de Análise de Atos de Concentração Horizontal (“Guia H”), com o objetivo ampliar o acesso da comunidade antitruste internacional a publicações institucionais da autarquia.

Lançado em 2016, o guia esclarece a metodologia utilizada pelo CADE para analisar operações que envolvem agentes que estão em uma mesma etapa da cadeia produtiva com o objetivo de auxiliar a compreender as etapas, técnicas e critérios adotados pela autarquia na análise de atos de concentração, bem como orientar o poder público sobre as melhores práticas. A versão em inglês do Guia H foi disponibilizada no site do CADE e pode ser consultada aqui.

 

 

Destaques do Poder Judiciário

 

Decisão liminar suspende medida preventiva do CADE em caso de THC2

Por decisão monocrática, o TRF-1 deferiu tutela recursal para suspender medida preventiva imposta pelo CADE contra Portonave S/A [1] em processo administrativo que investiga suposto abuso de posição dominante do operador portuário pela cobrança da taxa “THC2” (Terminal Handling Charge 2) em desfavor de recintos alfandegados [2].

A THC2 (ou Serviço de Segregação e Entrega – “SSE”) consiste na cobrança, pelo operador portuário, de tarifa adicional à tarifa básica (THC) dos recintos alfandegados independentes a título de “segregação de contêineres”. Os recintos alfandegados alegam que a cobrança seria indevida, já que o serviço de “segregação de contêineres” já estaria incluso na tarifa básica paga pelo armador.

O Desembargador-Relator da ação apresentada pela Portonave contra a medida preventiva entendeu que o CADE não seria competente para decidir sobre matéria regulatória da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), que havia expressamente autorizado a cobrança da THC2. Conforme o Relator, tal entendimento já havia sido proferido pela Sexta Turma do TRF-1 em decisão anterior [3], ocasião em que foi acordado que o CADE, ao decidir pela suspensão da cobrança da THC, bem como de outros valores a título de despesas adicionais para entrega de contêineres, estaria invadindo competência da ANTAQ.

A decisão do TRF1 também suspendeu o andamento do recurso voluntário apresentado pela empresa no CADE, que estava previsto para julgamento na Sessão de 10 de março de 2021.

 

 

Destaques da SEAE

 

SEAE abre Tomada de Subsídios para promover melhorias em agências reguladoras

A Secretaria de Advocacia da Concorrência e Competitividade (SEAE) publicou a Tomada de Subsídios nº 02/2021, uma consulta pública que convida agentes e administrados a apresentarem informações, de forma anônima, sobre a atuação de agências reguladoras federais. O objetivo é identificar elementos sobre a atuação das entidades e, a partir das informações coletadas, elaborar políticas públicas com intuito de promover a melhoria regulatória e concorrencial.

Os temas dentro do escopo da consulta incluem: (i) overreach regulatório, (ii) inadequação interpretativa ou procedimental, (iii) atuação excessiva em atos públicos de liberação; (iv) atuação indevida ou conflitante, (v) omissão regulatória, (vi) omissão com prejuízo concorrencial, dentre outros.

Os interessados em participar da Tomada de Subsídios deverão enviar suas considerações por e-mail à Secretaria, com cuidados para que a contribuição confira anonimato sobre o prestador das informações. O Aviso de Tomada de Subsídios pode ser acessado aqui.

 

SEAE conduz análise de entraves regulatórios no mercado de oxigênio medicinal

A SEAE oficiou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO) questionando acerca de eventuais leis e normativos infralegais que possam estar de alguma forma afetando negativamente a concorrência no mercado de oxigênio medicinal [4].

O intuito da SEAE é investigar se algum dispositivo normativo aplicável à produção, distribuição, importação e comercialização de oxigênio medicinal pode estar, por exemplo, dificultando a atuação dos agentes do setor ou travando a entrada de novos players. Também foram remetidos ofícios solicitando informações sobre o mercado de oxigênio medicinal a empresas de todo o Brasil.

 

 

Destaques da Superintendência-Geral

 

SG recomenda condenação de operadoras de telecomunicações por condutas anticompetitivas em licitações

A Superintendência-Geral recomendou a condenação das empresas Claro S/A (“Claro”), Oi Móvel S/A (“Oi”) e Telefônica Brasil S/A (“Telefônica”) em processo administrativo originado a partir de denúncia da BT Brasil Serviços de Telecomunicações Ltda. (“BT”) [5].

Segundo a BT, as Representadas teriam dificultado sua participação em Pregão realizado pelos Correios para contratação de serviços de internet banda larga (Serviço de Comunicação Multimídia – “SCM”), no qual Claro, Oi e Telefônica participaram por meio de consórcio. Isso porque as Representadas possuem controle sobre o acesso à infraestrutura local de telecomunicações e teriam recusado a contratação (especificamente, de links MPLS) ou ofertado preços discriminatórios para o acesso a circuitos de comunicação necessários à formação da proposta da BT para participação no Pregão referido. Além disso, as Representadas – as três maiores prestadoras de serviços de telecomunicações no Brasil – teriam se utilizado do instrumento do consórcio para coordenar interesses com o objetivo de eliminar a concorrência em diversas licitações, gerando efeitos anticompetitivos no setor de telecomunicações.

Após sua investigação, a SG concluiu que, em primeiro lugar, as empresas haviam de fato praticado condutas anticompetitivas unilaterais: Oi e Telefônica teriam praticado discriminação de preços no acesso a circuitos de comunicação ofertados à BT com a finalidade de dificultar sua participação no Pregão dos Correios, enquanto a Claro teria, com essa mesma finalidade, se recusado a contratar a BT.

Em segundo lugar, a SG entendeu que a participação das Representadas em diversas licitações por meio de consórcio de fato teve como objetivo restringir a concorrência, caracterizando conduta concertada entre concorrentes. A SG destacou que a formação de consórcios para participação em licitações não é, em si, equivalente a conduta concertada entre concorrentes. No entanto, esse instrumento pode caracterizar essa prática caso não haja justificativas para a formação de consórcio entre concorrentes.

Para a SG, o primeiro passo para determinar se um consórcio caracteriza conduta concertada é analisar se as empresas participantes são concorrentes em relação ao objeto da licitação em que pretendem participar, ou seja, que seriam capazes de executar o contrato licitado individualmente. Caso as empresas não sejam concorrentes nesse sentido – seja por atuarem em mercados distintos ou atuarem no mesmo mercado, mas serem incapazes de executar o contrato licitado de maneira independente devido a sua complexidade ou tamanho – o consórcio não caracterizaria conduta concertada. Caso as empresas sejam de fato concorrentes, seria necessário avaliar se sua atuação conjunta por meio de consórcio geraria eficiências que permitiriam ofertas comerciais mais vantajosas e que esses benefícios seriam superiores à restrição à concorrência causada pelo consórcio.

A SG destacou, ainda, que a cooperação reiterada entre concorrentes por meio de consórcio ou outro instrumento pode resultar em efetiva eliminação da concorrência, de forma que “não é justificável a manutenção de parcerias estáveis entre agentes para participação em licitações sob pena de restar caracterizada uma infração anticoncorrencial passível de condenação por este Conselho” (§ 433 do Parecer da SG).

Aplicando esses critérios ao caso concreto, a SG concluiu que a atuação das Representadas por meio de consórcio caracterizava conduta concertada, recomendando sua condenação. Isso porque as Representadas eram capazes de executar os contratos licitados de maneira independente, e não demonstraram que sua participação nos certames por meio de consórcio havia gerado eficiências capazes de superar as restrições à concorrência. Ao final, a SG ainda recomendou a todos os agentes do setor das Representadas:

  1. que levem o risco de caracterização de conduta anticompetitiva em consideração ao decidir suas estratégias de participação em licitações públicas ou privadas;
  2. que, antecipadamente à tomada de decisão com vistas a participar de um consórcio, elaborem e guardem minuciosos estudos internos que possam evidenciar de modo claro a existência de razões técnicas e econômicas que constituem empecilho efetivo à sua participação individual em um determinado processo licitatório;
  3. que adotem critérios objetivos, isonômicos e não discriminatórios ao ofertar serviços de conectividade no mercado de atacado, independentemente da existência de regulação específica.

O caso deverá agora ser julgado pelo Tribunal do CADE, que poderá seguir ou não as recomendações da SG.

 

SG impõe medida preventiva contra iFood por contratos de exclusividade com restaurantes

A Superintendência-Geral decidiu adotar medida preventiva contra o aplicativo de delivery online iFood, no âmbito de investigação iniciada após representações da concorrente Rappi e da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) [6].

Em síntese, a Rappi argumenta que o iFood estaria se utilizando de sua posição dominante no mercado de pedidos online de comida para impor contratos de exclusividade de longa duração e com elevadas multas por rescisão a grandes redes de restaurantes, fechando o mercado contra plataformas de delivery online concorrentes. A Abrasel, por sua vez, também argumentou em sua Representação que o iFood se utiliza de contratos de exclusividade com restaurantes para fechar o mercado contra concorrentes, prejudicando a livre concorrência. Por fim, a concorrente Uber Eats apresentou pedido de intervenção como terceiro interessado no processo de investigação no CADE, reforçando os argumentos de que a política de celebração de acordos de exclusividade do iFood criaria barreiras à entrada e à expansão de concorrentes no mercado.

De acordo com a SG, os indícios reunidos nos autos indicam que o iFood de fato detém posição dominante no mercado, dado que a empresa possui participação de mercado superior a 20% em todos os cenários considerados e conta com uma “vantagem de pioneiro” por ter sido a primeira a explorar esse mercado no Brasil. Além disso, a instrução do procedimento junto ao CADE teria demonstrado que o iFood efetivamente firmou contratos de exclusividade com grandes redes de restaurantes responsáveis por um volume muito relevante de faturamento e que são cruciais para a atração de usuários à plataforma (“must-have”). Dessa forma, os contratos de exclusividade do iFood teriam o potencial de fechar o mercado contra plataformas concorrentes.

Com isso, a SG decidiu converter o procedimento preparatório iniciado em fevereiro em inquérito administrativo e impor medida preventiva proibindo iFood de firmar novos contratos que contenham cláusulas de exclusividade. A medida preventiva também estabelece que a empresa não deverá alterar contratos já celebrados sem cláusula de exclusividade até decisão final do caso. Por outro lado, os contratos de exclusividades já em vigor permanecem válidos e, no término de sua vigência, poderão ser renovados em regime de exclusividade observando o limite de um ano de duração caso haja interesse de ambas as partes.

 

SG instaura investigação de práticas anticompetitivas em mercado de trabalhadores empregados na indústria de healthcare

A SG instaurou processo administrativo para investigar supostas condutas anticompetitivas no mercado brasileiro de trabalhadores empregados na indústria de produtos, equipamentos e serviços correlatos para cuidados com a saúde (healthcare) [7].

Segundo a Nota Técnica de instauração do processo, ao menos 36 empresas, com graus distintos de envolvimento, e mais de cem pessoas físicas funcionárias ou ex-funcionárias dessas empresas teriam trocado informações concorrencialmente sensíveis sobre gestão de pessoas e recursos humanos para apoiar suas tomadas de decisão sobre contratação, remuneração e manutenção de funcionários. Além disso, teria havido ao menos dois episódios de alinhamento entre concorrentes em relação a acordos anticompetitivos de fixação de remuneração laboral. A investigação teve início a partir de acordo de leniência firmado pelo CADE com as pessoas jurídicas Getinge do Brasil Equipamentos Médicos Ltda. e Maquet Cardiopulmonary do Brasil Comércio Ltda., que renunciaram ao sigilo de suas identidades.

Trata-se da primeira investigação do CADE de supostas práticas concertadas afetando a remuneração e aspectos da contratação de trabalhadores. O tema já vem sendo investigado há algum tempo nos EUA e esse caso é um alerta para empresas que atuam no Brasil. Em artigo publicado no ConJur há alguns meses, nossos sócios José Del Chiaro e Luís Nagalli apontam que mesmo empresas com políticas de compliance amadurecidas talvez ainda não tenham incluído dentre as práticas a serem investigadas condutas que ocorrem nos seus departamentos de RH. No Valor Econômico, Nagalli e Ademir Pereira Jr. destacaram a experiência americana e a necessidade de atenção no Brasil.

 

 

Destaques da Sessão de Julgamento

 

Tribunal nega pedido de revisão de operação entre Biosev e Raízen

O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, homologar despacho da Presidência do CADE que negou ingresso como terceiro interessado apresentado pela Abrilivre (Associação Brasileira de Revendedores de Combustíveis Independentes e Livres) em ato de concentração referente à aquisição da Biosev S.A. pelo Grupo Raízen [8].

Em síntese, o ato de concentração havia tramitado sob o rito sumário e foi aprovado sem restrições em 01 de março de 2021. A AbriLivre requereu seu ingresso como terceira interessada no dia 03 de março de 2021, ainda dentro do prazo legal de apresentação desse tipo de requerimento, mas após aprovação do ato de concentração pela SG. O pedido foi, então, endereçado à Presidência do CADE, nos termos do Regimento Interno da autarquia.

Conforme o Presidente Alexandre Barreto, a AbriLivre não apresentou elementos que indicassem claramente algum potencial lesivo decorrente da operação. De fato, o pedido da associação não teria demonstrado a existência de nexo de causalidade entre a operação e o aumento de riscos concorrenciais mencionados, i.e. que a operação elevaria o poder de mercado do Grupo Raízen-Cosan e geraria efeitos líquidos negativos ao bem-estar dos consumidores.

Assim, o Presidente Alexandre Barreto emitiu despacho pela não admissão da associação enquanto terceira interessada. O despacho foi homologado pelos demais Conselheiros do CADE.


NOTAS
1 Agravo de Instrumento nº 1008154-87.2021.4.01.0000.
2 Processo Administrativo nº 08700.007049/2018-45 e Recurso Voluntário nº 08700.004943/2020-88.
3 Apelação nº 1005826-43.2019.4.01.3400.
4 Processo nº 10099.100030/2021-60.
5 Processo Administrativo nº 08700.011835/2015-02.
6 Inquérito Administrativo nº 08700.004588/2020-47.
7 Processo Administrativo nº 08700.004548/2019-61.
8 Ato de Concentração nº 08700.000471/2021-75.