171ª Sessão Ordinária do Tribunal do CADE realizada em 3 de fevereiro de 2021. Pautas, atas e áudio da Sessão disponíveis em www.cade.gov.br

 

Destaques da SEAE

 

SEAE avalia impactos de proposta de alteração da prescrição intercorrente de processos em fase de execução

A Secretaria de Advocacia da Concorrência e Competitividade do Ministério da Economia (SEAE) emitiu Nota Técnica [1] contendo avaliação dos potenciais impactos de minuta de Projeto de Lei (PL) [2] que alteraria o artigo 921 do Código de Processo Civil (CPC) para ampliar o alcance da prescrição intercorrente nos processos cíveis em fase de execução. Em especial, a minuta de PL propõe as seguintes alterações:

(i) que o termo inicial do prazo de prescrição intercorrente seja contado a partir da publicação nos autos do despacho de certificação da primeira tentativa infrutífera de localização do devedor ou de bens penhoráveis;
(ii) que, a pedido do credor, a prescrição intercorrente possa ser suspensa, por uma única vez, durante o prazo máximo de 1 ano, nos casos em que não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora;
(iii) que a efetiva localização de bens penhoráveis interrompa o prazo de prescrição, que não correrá pelo tempo necessário à citação e intimação do devedor, bem como para as formalidades da adjudicação ou alienação, se necessária, desde que o credor cumpra os prazos previstos na lei processual ou fixados pelo juiz;
(iv) que o mero peticionamento de busca do devedor ou de bens penhoráveis não interrompa nem suspenda o prazo de prescrição;
(v) que as regras mencionadas também sejam aplicadas aos requerimentos de cumprimento de sentença.

Conforme descreve a Nota Técnica, a proposta objetiva melhorar o ambiente de negócios no Brasil com medidas que melhorariam o indicador de Execução de Contratos apurado pelo Relatório Doing Business do Banco Mundial, que avalia o tempo, o custo e a qualidade do processo judicial para a recuperação de crédito decorrente do inadimplemento contratual entre empresas. Para a SEAE, a minuta de PL de fato tem o potencial de promover avanço significativo em termos de redução do tempo de duração dos processos judiciais. Assim, a SEAE recomendou seu encaminhamento à Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade (SEPEC) para análise.

 

Destaques da Superintendência-Geral

 

SG instaura procedimento contra iFood após Representações de Rappi e Abrasel

A Superintendência-Geral instaurou Procedimento Preparatório [3] para investigar supostas práticas anticompetitivas atribuídas ao iFood após apresentação de Representações pela Rappi, em setembro de 2020, e pela Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), em dezembro de 2020.

Em síntese, a Rappi argumenta que o iFood estaria se utilizando de sua posição dominante no mercado de pedidos online de comida para impor contratos de exclusividade de longa duração e com elevadas multas por rescisão a grandes redes de restaurantes. Como resultado, concorrentes do iFood não seriam capazes de ofertar determinados restaurantes-chave ou “VIPs”, necessários para se tornarem atrativos aos consumidores finais. A conduta do iFood resultaria, assim, no fechamento do mercado de restaurantes contra rivais como a Rappi. Assim, a Rappi requer que a SG conceda medida preventiva para que todas as obrigações de exclusividade celebradas pelo iFood com restaurantes sejam imediatamente suspensas.

A Abrasel, por sua vez, também argumentou em sua Representação que o iFood se utiliza de contratos de exclusividade com restaurantes para fechar o mercado contra concorrentes, prejudicando a livre concorrência. Assim como a Rappi, a Abrasel requereu que a SG conceda medida preventiva para suspender as obrigações de exclusividade firmadas pelo iFood com restaurantes.

Instado a se manifestar, o iFood argumentou que seus contratos de exclusividade contam com sólida justificativa econômica, geram benefícios para os restaurantes que são repassados aos consumidores na forma de melhores serviços e não resultam em efeitos anticompetitivos, dado que a maior parte dos estabelecimentos não está vinculada a contratos de exclusividade com a empresa. Além disso, o iFood afirma que o mercado de pedidos de comida é extremamente dinâmico e marcado por alta rivalidade e constantes inovações e entradas, de forma que a empresa não seria capaz de exercer poder de mercado.

 

Destaques da Sessão de Julgamento

 

Tribunal impõe medidas preventivas contra cobrança de THC2 no Porto de Itajaí/SC

O Tribunal do CADE decidiu, por maioria, dar provimento a recursos voluntários interpostos pela Localfrio Armazéns Gerais Frigoríficos (“Localfrio”) [4], impondo medidas preventivas contra os operadores logísticos do Complexo Portuário de Itajaí/SC Portonave Terminais Portuários de Navegantes (“Portonave”) e APM Terminals Itajaí (“APM”). As medidas preventivas determinam a suspensão da cobrança da taxa Terminal Handling Charge 2 (THC2) até o julgamento de mérito dos processos que investigam essa prática [5].

Em síntese, a THC2 (ou Serviço de Segregação e Entrega – “SSE”) consiste na cobrança, pelo operador portuário, de tarifa adicional à tarifa básica (THC) a título de “segregação de contêineres” dos recintos alfandegados independentes. Os recintos alfandegados alegam que a cobrança seria indevida, já que o serviço de “segregação de contêineres” já estaria incluso na tarifa básica paga pelo armador.

Segundo a maioria do Tribunal do CADE, as cobranças da THC2 teriam alto potencial lesivo à concorrência, posto que podem criar barreiras à atuação dos recintos alfandegados independentes por meio da elevação artificial de seus custos. Além disso, o aumento de custo imposto aos recintos alfandegados independentes acabaria por desviar demanda para os próprios operadores portuários, que não arcam com a cobrança de THC2, tornando os recintos alfandegados menos competitivos para os importadores.

Dessa forma, a maioria do Tribunal decidiu dar provimento aos recursos da Localfrio, revertendo decisões anteriores da SG, que havia negado a imposição de medidas preventivas, nos termos dos votos dos Conselheiros Relatores Luiz Hoffmann e Luis Braido. Restaram vencidos os Conselheiros Sérgio Ravagnani e Lenisa Prado.

 
Tribunal condena Tecon Suape por cobrança de THC2

Ainda sobre o tema da cobrança da Terminal Handling Charge 2 (THC2) por operadores portuários, o Tribunal do CADE condenou, por maioria, o operador Tecon Suape S.A. (“Tecon Suape”) por impor cobrança da taxa a recintos alfandegados no Porto de Suape/PE [6].

Em síntese, a maioria do Tribunal entendeu que a cobrança da THC2 pelo Tecon Suape foi abusiva por aumentar os custos de recintos alfandegados que competem com o operador portuário sem justificativa, dado que os custos do operador já seriam remunerados mediante o pagamento da THC pelo armador. Para a maioria do Tribunal, ainda, a cobrança da THC2 poderia ser considerada anticompetitiva mesmo após sua regulamentação pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), uma vez que a licitude da perspectiva regulatória não afasta a possibilidade de que se trate de infração à ordem econômica.

Dessa forma, a maioria do Tribunal decidiu condenar o Tecon Suape, conforme o voto do Conselheiro Relator Luiz Hoffmann, aplicando uma multa de aproximadamente R$ 9 milhões à empresa. Restaram vencidos os Conselheiros Sérgio Ravagnani e Lenisa Prado.

 
Tribunal aplica multa com base na vantagem auferida e discute cálculo de multas a pessoas físicas

O Tribunal do CADE condenou as empresas Araguaia Indústria, Comércio e Serviços Ltda. – EPP (“Araguaia”) e Redex Telecomunicações Ltda. (“Redex”) e as pessoas físicas João Antônio César, José Santos Calvo Sebastian e Álvaro Rodrigo Peña pela prática de cartel no mercado de componentes eletrônicos para o setor de telecomunicações. Durante o julgamento, o Tribunal discutiu detalhadamente sobre a dosimetria de multas por prática de cartel e a aplicabilidade de multas a pessoas físicas não administradoras.

Primeiro, a maioria do Tribunal decidiu aplicar à Araguaia multa calculada com base na estimativa de vantagem auferida pela empresa com o cartel. Isso porque, enquanto não havia nos autos elementos que permitissem estimar a vantagem auferida pela Redex (cuja multa, calculada com base em um percentual sobre seu faturamento no ano anterior à instauração do processo administrativo, alcançou R$ 1.548.219,87), notas fiscais disponíveis nos autos permitiam verificar os valores recebidos pela Araguaia a título de remuneração pela apresentação de ofertas de cobertura em licitações privadas. Assim, o Conselheiro Sérgio Ravagnani votou pela aplicação de multa consistente na soma dos valores recebidos pela Araguaia corrigidos pelo IPCA, e não pela SELIC, índice utilizado para atualizar multas calculadas com base no faturamento das empresas, sendo acompanhado pela maioria do Tribunal. A multa à Araguaia totalizou R$ 2.411.603,60, e restaram vencidos quanto à utilização dessa dosimetria os Conselheiros Luiz Hoffmann, Mauricio Bandeira Maia e o Presidente Alexandre Barreto.

Além disso, a maioria do Tribunal decidiu aplicar às pessoas físicas administradoras João Antônio César e José Santos Sebastián multas de R$ 197.991,17 e R$ 1.150.499,40, respectivamente. Tais valores teriam sido calculados não apenas como percentuais das multas aplicadas às empresas de que essas pessoas físicas eram administradoras, mas também considerando a situação econômica de cada uma, conforme o voto-vista do Conselheiro Sérgio Ravagnani. Restaram vencidos quanto à utilização dessa dosimetria os Conselheiros Luiz Hoffmann, Mauricio Bandeira Maia e o Presidente Alexandre Barreto.

Por fim, a maioria do Tribunal decidiu aplicar à pessoa física não-administradora Álvaro Rodrigo Peña uma multa de R$ 100.000,00. Neste ponto, restaram vencidos a Conselheira Relatora Paula Farani e os Conselheiros Sérgio Ravagnani e Lenisa Prado, que haviam votado pela não aplicação de multa ao Representado por não se tratar de pessoa física administradora.

 
Tribunal inicia discussão sobre validade de Acordo de Leniência diante de suposta coação de signatários

O Tribunal do CADE deu início ao julgamento de suposto cartel no mercado de prestação de serviços de agenciamento de frete internacional aéreo e marítimo de cargas tendo o Brasil como origem ou destino [7].

Em seu voto, a Conselheira Relatora Lenisa Prado acolheu argumentos da defesa que sustentavam a presença de vícios na celebração do Acordo de Leniência celebrado com a extinta Secretaria de Direito Econômico (SDE), que deu início ao processo. Em síntese, um processo trabalhista promovido por uma das pessoas físicas signatárias do Acordo de Leniência teria revelado que a suposta ocorrência de coação no momento de assinatura do Acordo.

Assim, a Conselheira Relatora votou pela declaração de nulidade do Acordo de Leniência assinado pelo Grupo DHL, bem como pela não aplicação dos benefícios decorrentes do Acordo; pela aplicação de proibição durante 3 anos de celebração de novo acordo de leniência pelos signatários do Acordo anulado; pelo arquivamento do processo em relação aos Compromissários dos Termos de Compromisso de Cessação, dado que são terceiros de boa-fé em relação à nulidade do Acordo de Leniência e que cumpriram integralmente suas obrigações; e pelo arquivamento do processo em relação aos demais Representados devido à anulação das evidências do Acordo de Leniência.

Em seguida ao voto da Conselheira Relatora, o Conselheiro Maurício Maia apresentou pedido de vista, suspendendo o julgamento do processo.


NOTAS
[1] Nota Técnica para Atos Normativos SEI nº 78/2021/ME.
[2] A minuta foi proposta, conjuntamente, pela Procuradoria da Fazenda Nacional, Advocacia Geral da União, Ministério da Justiça e Segurança Pública e Secretaria de Modernização do Estado da Presidência da República.
[3] Procedimento Preparatório nº 08700.004588/2020-47.
[4] Recurso Voluntário nº 08700.004935/2020-31 e Recurso Voluntário nº 08700.004943/2020-88.
[5] Processo Administrativo nº 08700.007049/2018-45 e Processo Administrativo nº 08700.007396/2016-14.
[6] Processo Administrativo nº 08700.005499/2015-51.
[7] Processo Administrativo nº 08012.001183/2009-08.