1ª Sessão Extraordinária do Tribunal do CADE realizada em 20 de janeiro de 2021. Pautas, atas e áudio da Sessão disponíveis em www.cade.gov.br

 

Destaques do Departamento de Estudos Econômicos do CADE

 

DEE apresenta recomendações sobre proposta de monitoramento de preços de dispositivos médicos

O Departamento de Estudos Econômicos do CADE (DEE) emitiu Nota Técnica [1] com recomendações em resposta a consulta feita pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) sobre os possíveis impactos concorrenciais de uma proposta de monitoramento de preços no mercado de dispositivos médicos no Brasil. A medida visaria o enfrentamento da “ampla disfuncionalidade” do mercado de Dispositivos Médicos (DM), além de contribuir para a redução relativa dos preços praticados neste mercado.

Em sua análise, o DEE destacou que a transparência de preços tem efeitos incertos sobre os mercados. Em síntese, embora possa facilitar as escolhas e decisões dos consumidores, é possível, dependendo de fatores estruturais do mercado, que resulte em elevação de preços, seja por permitir uma sinalização para que empresas ajustem seus preços com base em um ponto focal, seja pela facilitação de comportamentos colusivos.

Feitas essas ressalvas, o DEE apresentou algumas recomendações para a elaboração de um sistema de monitoramento de preços:

(i) Limitar as informações sobre preços a valores agregados de no mínimo 3 empresas (como propõe a Anvisa), evitando assim a identificação individual dos agentes, e publicar os preços defasados em no mínimo 3 meses;
(ii) Publicar apenas valores mínimos, máximos e os percentis 35% e 65% das informações agregadas de preços (também como propõe a Anvisa), tratando devidamente os outliers;
(iii) Não divulgar valores médios dos preços de produtos;
(iv) Garantir um nível de qualidade das informações, de modo que o banco de dados represente fielmente o mercado brasileiro;
(v) Observar as diferentes cargas tributárias entre Estados e Municípios, de modo a não distorcer a comparação entre preços;
(vi) Fazer todos os esforços possíveis para diminuir ou eliminar barreiras à entrada como reduzir protecionismos nos licenciamentos médicos e eliminar requisitos burocráticos na aprovação de novos dispositivos;
(vii) Facilitar a importação de dispositivos médicos para que estes cheguem ao mercado nacional com preços competitivos.

 

Destaques da Superintendência-Geral

 

SG não conhece operação por ausência de efeitos no Brasil

A Superintendência-Geral decidiu não conhecer a operação de aquisição da McInnis Cement Inc., uma cimenteira sediada em Montreal, no Canadá, pela St. Marys Cement Inc., uma subsidiária integral da Votorantim Cimentos International S.A., que fabrica e distribui materiais de construção em Toronto, no Canadá. [2]

As requerentes haviam solicitado o não conhecimento do ato de concentração, argumentando que a operação não gerará efeitos no território brasileiro. A SG concordou com os argumentos das requerentes, concluindo que a operação seria realizada no exterior (foreign-to-foreign) e que as empresas McInnis e a St. Marys realizam suas atividades exclusivamente no Canadá e nos EUA, não possuindo atuação, presença, faturamento nem vendas para o Brasil nos últimos 5 anos.

Assim, embora os grupos econômicos das requerentes atingissem os critérios de faturamento para a notificação de operações ao CADE, a SG concluiu que a operação não deveria ser conhecida devido a não produzir impactos no Brasil, ainda que potenciais.

 

Destaques da Sessão de Julgamento

 

Tribunal aprova aquisição de linhas de medicamentos da Takeda pela Hypera com restrições

O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, aprovar a operação de aquisição de um portfólio de medicamentos da Takeda Pharmaceuticals International (“Takeda”) pela Hypera S/A (“Hypera) condicionada à celebração de Acordo em Controle de Concentrações (ACC). [3] Após o fechamento da operação, a Hypera deterá e comercializará as linhas de produtos Eparema, Xantinon, Nenê-Dent, Albocresil, Venalot, Nebacetin, Neosaldina, Ad-Til, Alektos, Nesina e Dramin.

Conforme o voto da Conselheira Relatora Paula Farani, a operação despertaria preocupações no mercado de Hepatoprotetores e Lipotrópicos (medicamentos Xantinon e Xantinon Complex), onde a participação combinada das partes chegariam a 70-80% em termos de volume. Nos demais mercados, a Conselheira Relatora concluiu que o exercício de poder de mercado seria pouco provável devido à baixa participação de mercado das partes, a possibilidade de entradas, presença de medicamentos similares e genéricos, a existência de rivalidade potencial, dentre outros fatores.

Assim, de forma a endereçar as preocupações concorrenciais identificadas, as partes negociaram com o CADE um ACC com remédio estrutural consistente na alienação das linhas dos medicamentos Xantinon e Xantinon Complex e de todos os ativos intangíveis, como propriedade intelectual, registros sanitários e know how necessário para a fabricação desses medicamentos. Embora o ACC somente tenha sido aprovado na Sessão de Julgamento, a Hypera já havia submetido ao CADE a alienação dos medicamentos à União Química em outubro de 2020, tendo a operação sido aprovada sem restrições ao final daquele mês [4]. Dessa forma, a medida eliminou a sobreposição horizontal no mercado de Hepatoprotetores e Lipotrópicos.

 

Tribunal rejeita avocação de investigação de suposta prática de sham litigation

O Tribunal do CADE decidiu, por maioria, não homologar despacho da Conselheira Lenisa Prado que propunha a avocação de investigação supostas práticas de sham litigation (o abuso do direito de petição com efeitos anticompetitivos) e estratégias abusivas no âmbito do direito patentário nos mercados de medicamentos à base de (i) esomeprazol (“Nexium”, utilizado para tratamento gastrointestinal); (ii) quetiapina (“Seroquel”, utilizado em tratamentos psiquiátricos e de esquizofrenia); e (iii) rosuvastatina cálcica (“Crestor”, utilizado contra doenças cardiovasculares). [5]

Em síntese, a Conselheira Lenisa Prado argumentou que a Superintendência-Geral deveria ter investigado indícios de “evergreening” em relação aos pedidos de patentes relacionados a esomeprazol, ou seja, de supostas estratégias da Representada AstraZeneca que poderiam estender artificialmente o prazo de exclusividade conferido a suas patentes.

Em julgamento, o Conselheiro Maurício Bandeira Maia abriu divergência pela não homologação do despacho de avocação, argumentando que a instrução da SG havia sido satisfatória e que não havia restado clara a existência de indícios de que ações judiciais e/ou processos administrativos careciam completamente de fundamento jurídico. Assim, a decisão da SG de arquivar a investigação estaria em linha com a jurisprudência do CADE em casos de sham litigation.

Aderiram ao voto do Conselheiro Maurício Bandeira Maia os Conselheiros Luiz Hoffmann, Sérgio Ravagnani, Luis Braido e o Presidente Alexandre Barreto, formando maioria pela não homologação do pedido de avocação. A Conselheira Paula Farani acompanhou a Conselheira Lenisa Prado. Com isso, o arquivamento da investigação foi confirmado pelo Tribunal.

 

Tribunal do CADE rejeita avocação de investigação de supostas práticas anticompetitivas relacionadas ao não recolhimento de tributos

O Tribunal do CADE decidiu, por maioria, não homologar despacho do Conselheiro Luis Braido que propunha a avocação de investigação de supostas práticas anticompetitivas relacionadas ao não recolhimento de tributos no setor de distribuição de combustíveis [6].

A investigação havia sido instaurada após representação da Associação Brasileira de Combate às Fraudes de Combustíveis (“ABCFC”), que argumentava que distribuidoras de combustíveis do Estado do Rio de Janeiro teriam deixado de recolher tributos de forma deliberada e contumaz com o objetivo de praticar preços baixos na distribuição de etanol hidratado e, com isso, excluir concorrentes do mercado.

Em síntese, o Conselheiro Luis Braido argumentou que não seria possível descartar que os preços praticados pelas Representadas estariam abaixo de seus custos, caso fossem considerados os custos atinentes ao devido pagamento dos tributos aplicáveis. Dessa forma, para o Conselheiro, o não pagamento de tributos poderia configurar infração à ordem econômica e, assim, atrair a competência do CADE. Além disso, seria necessário aprofundar a análise sobre a definição de mercado relevante adotada pela Superintendência-Geral. Para endereçar esses pontos, a SG deveria, então, conduzir instrução complementar.

Também neste caso, o Conselheiro Maurício Bandeira Maia abriu divergência pela não homologação do despacho de avocação, argumentando que a instrução da SG havia deixado claro que as Representadas não possuíam participação de mercado superior a 20%, de forma que “considerando a inexistência de poder de mercado por parte das Representadas, os possíveis danos à sociedade de condutas reiteradas de não recolhimento de impostos devem ser tratados nas esferas adequadas de decisão”. Os Conselheiros Luiz Hoffmann e Paula Farani acompanharam o voto do Conselheiro Luis Braido pela avocação, enquanto os Conselheiros Sérgio Ravagnani e Lenisa Prado e o Presidente Alexandre Barreto acompanharam a divergência instaurada pelo Conselheiro Maurício Bandeira Maia, formando maioria. Com isso, o arquivamento da investigação foi confirmado pelo Tribunal.


NOTAS
[1] Nota Técnica nº 2/2021/DEE/CADE no Processo nº 08700.000213/2021-99.
[2] Ato de Concentração nº 08700.006517/2020-89.
[3] Ato de Concentração nº 08700.003553/2020-91.
[4] Ato de Concentração nº 08700.004735/2020-89.
[5] Inquérito Administrativo nº 08012.001693/2011-91.
[6] Inquérito Administrativo nº 08700.002532/2018-33.