3ª Sessão Extraordinária do Tribunal do CADE realizada em 21 de dezembro de 2020. Pautas, atas e áudio da Sessão disponíveis em www.cade.gov.br

 

Destaques da Superintendência-Geral

 

SG instaura investigação no mercado de transporte de valores

A Superintendência-Geral instaurou Inquérito Administrativo para apurar potencial infração à ordem econômica por agentes do setor de transporte de valores, incluindo Prosegur, Protege, Brink’s, Associação Brasileira de Transporte de Valores (ABTV), Federação Nacional das Empresas de Transporte de Valores (FENAVAL) e Federação Nacional das Empresas de Segurança e Transporte de Valores (FENAVIST) [1].

A Representação que deu origem ao IA foi apresentada pela Procuradoria Federal Especializada junto ao CADE (ProCADE), que informou ter tomado conhecimento de que as representadas estariam atuando em “potencial coordenação (com suspeitas sérias de conluio) para não apenas impedir que outros concorrentes da franja de mercado dele participem, mas para efetivamente dividi-lo e impor a ele o incremento de preços praticados”.

Segundo Ofício da ProCADE, as empresas estariam reforçando seu poder de mercado mediante incremento coordenado de preços e postura comportamental de non-compete, inclusive com estratégias de sham litigation e lobby para impedir a entrada de potenciais concorrentes. Para a ProCADE, caso confirmados, esses fatos representariam sérios riscos de comprometimento da competitividade do mercado de transporte de valores. Assim, seria necessária a intervenção do CADE com a abertura da investigação.

 

SG não conhece operação de compra de ações de usinas de energia

A Superintendência-Geral decidiu não conhecer operação referente à aquisição pelo FIP IE, gerido pela BTG Pactual Gestora de Recursos, das companhias Linhares e PCH Braço, detidas pelo FIP Vulcan, e da Tropicália Transmissão de Energia S.A., detida por quatro fundos de investimentos (FIP Tropicália, FIP Warehouse, FIP Infra Energia 3 e FIP Infra Energia 2) [2].

As requerentes haviam solicitado o não conhecimento da operação à SG por considerá-la uma mera reorganização societária, notificando-a apenas ad cautelam. Argumentaram, em síntese, que os grupos econômicos envolvidos não atingiam os critérios de faturamento para determinar que a notificação seja obrigatória [3].

Em sua decisão, a SG concordou com o argumento de que os grupos econômicos envolvidos não atingiam os critérios de faturamento para determinar que a notificação seja obrigatória. Isso porque, enquanto o faturamento do Grupo BTG Pactual, controlador de fundos do polo vendedor, atingiu montante superior a R$ 750 milhões, o FIP IE não atingiria faturamento de ao menos R$ 75 milhões quando o gestor do fundo (BTG Pactual Gestora de Recursos) não é levado em conta no cálculo de faturamento do grupo econômico. Trata-se de mais um precedente onde a SG reforça seu entendimento de que não se deve considerar o gestor de fundos de investimento para efeitos de composição de grupo econômico para fins de cálculo de faturamento.

 

SG não conhece operação de aquisição de direitos e ativos do medicamento Rivotril

A Superintendência-Geral decidiu não conhecer a operação de aquisição, pela Cheplapharm, dos direitos comerciais do medicamento Rivotril e ativos associados, produzidos e distribuídos pela Roche e suas afiliadas, em múltiplos países, incluindo o Brasil [4].

Segundo a SG, havia, em síntese, duas questões a esclarecer para determinar se a notificação da operação era obrigatória: se o cálculo do faturamento do grupo econômico da Cheplapharm deveria considerar o faturamento advindo de uma operação anterior não conhecida pela SG em 2020 [5] e qual a taxa de câmbio aplicável para calcular o faturamento da Cheplapharm no Brasil (que é registrado em dólares) em 2019.

Conforme entendeu a SG, a taxa de câmbio aplicável é aquela do último dia útil do ano anterior à operação, em consonância com precedentes [6] e como determinado pelo Regimento Interno do CADE [7]. Considerando-se essa taxa de câmbio, o faturamento bruto do grupo econômico da Cheplapharm não atingiria R$ 75 milhões em 2019 mesmo que se considerasse o faturamento advindo da operação anterior não conhecida pela SG em 2020. Assim, a operação de aquisição de direitos e ativos do Rivotril não foi conhecida.

 

SG não conhece operação de cisão e transferência de ações da XP dentro do Grupo Itaú

A Superintendência-Geral decidiu não conhecer a operação de cisão das ações representativas do capital social da XP Inc. (“XP”) atualmente detidas, indiretamente, pela Itaú Unibanco Holding S.A. (“IUH”), e subsequente transferência para uma “Newco” cujos controladores serão a Itaú Unibanco Participações S.A. (“IUPAR”) e a Itaúsa S.A. (“Itaúsa”) [8].

Em sua decisão, a SG destacou não ter identificado a entrada de novos sócios ou alterações sobre o percentual de participação societária do Grupo Itaú na XP, de forma que não haveria dois grupos distintos envolvidos na operação. Dessa forma, tratar-se-ia de mera reorganização societária intragrupo, não devendo ser conhecida pelo CADE.

 

Destaques da Sessão de Julgamento

 

Tribunal aprova aquisição de ativos da Sacel pela Prosegur com restrições

Por unanimidade, o Tribunal do CADE aprovou aquisição de ativos tangíveis e intangíveis (veículos blindados e contratos com clientes) da Sacel (Sacel Serviços de Vigilância e Transporte de Valores – Eireli), relativos às atividades do segmento de transporte e custódia de valores da empresa, pela Prosegur (Prosegur) Brasil Transportadora de Valores e Segurança S.A., condicionada a restrições definidas em Acordo em Controle de Concentrações (ACC) [9]. A operação já havia sido consumada em 2019, e foi notificada ao CADE pelas partes após solicitação pelo Tribunal no início de 2020 [10].

Conforme o voto da Conselheira Relatora Paula Farani, a operação gerou impacto significativo especialmente no Estado de Sergipe, visto que a Sacel era a única rival com capacidade de contestar o poder de mercado das empresas incumbentes nesse Estado. Em especial, as entradas de Kairós e Tecban nos últimos cinco anos não teriam surtido efeitos no aumento da rivalidade do mercado sergipano, de forma que a operação levantava sérias preocupações concorrenciais.

Para mitigar essas preocupações, a Prosegur negociou um ACC no qual assume compromissos comportamentais. A empresa não poderá participar de atos de concentração envolvendo outras empresas que ofertem serviços de transporte de valores nos Estados de Sergipe, Alagoas, Bahia e Pernambuco pelo período de quatro anos. A empresa também ficará proibida, pelo período de três anos, de realizar operações neste setor nos Estados da Paraíba e Rio Grande do Norte. Ainda, a Prosegur deverá informar ao CADE sobre quaisquer novas aquisições nos Estados de Sergipe, Alagoas, Bahia e Pernambuco, independentemente do faturamento das empresas envolvidas, pelos dois anos seguintes, e sobre quaisquer novas aquisições nos Estados da Paraíba e Rio Grande do Norte, pelo período de três anos.

 

Tribunal rejeita recurso do Grupo Globo e mantém medida preventiva contra bonificação por volume a agências de publicidade

Por maioria, o Tribunal do CADE conheceu e rejeitou recurso do Grupo Globo contra medida preventiva adotada pela SG para determinar que o Grupo Globo (i) abstenha-se de celebrar novos contratos de Plano de Incentivo e (ii) abstenha-se de realizar qualquer adiantamento nos Planos de Incentivo, seja em contratos vigentes ou futuros [11].

A medida preventiva em questão foi adotada em sede de inquérito administrativo [12] instaurado contra o Grupo Globo Comunicações para apurar a adoção de cláusulas de “bonificação por volume” (BV) em contratos com agências de publicidade que lhe prestam serviços no segmento de programação de conteúdo para TV aberta e fechada. A bonificação por volume trata, em síntese, de uma forma de “plano de incentivo” para que as agências prestem serviços em determinados volumes ao pagador da BV.

Em seu voto, o Conselheiro Relator Maurício Bandeira Maia conheceu o Recurso Voluntário e votou por sua rejeição, mantendo integralmente as condições estipuladas na medida preventiva. O Conselheiro considerou que estariam presentes os elementos necessários para adoção da cautelar: o Grupo Globo deteria posição dominante e suas cláusulas de bonificação por volume não-fixos nem lineares combinados com a oferta de adiantamentos teriam o potencial de fechar o mercado contra concorrentes (fumus boni iuris), e o fato de que efeitos anticompetitivos já estão ocorrendo justificaria a urgência da medida (periculum in mora).

A Conselheira Paula Azevedo instaurou divergência a favor do provimento do recurso do Grupo Globo, argumentando que a prática de BV é adotada por todas as emissoras de TV, e não apenas pelo Grupo Globo, e que a medida preventiva não causaria prejuízos à representada, e sim às agências de publicidade que contratam o grupo, já que não poderão obter os valores de bonificação devidos a elas. Além disso, a prática de comissionamento de agências de publicidade seria praticada e conhecida há muitos anos, já tendo sido até mesmo objeto de investigação pelo CADE [13], de forma que não haveria urgência a justificar a medida preventiva.

Em votação, acompanharam o Relator o Conselheiro Luiz Hoffman e o Presidente Alexandre Barreto, enquanto os Conselheiros Lenisa Prado e Luis Braido acompanharam a Conselheira Paula Farani. O Presidente usou, então, seu voto de qualidade para desempatar o julgamento a favor da rejeição do recurso do Grupo Globo. O Conselheiro Sérgio Ravagnani não compareceu à sessão.


NOTAS
[1] Inquérito Administrativo nº 08700.006327/2020-61.
[2] Ato de Concentração nº 08700.006040/2020-31.
[3] Ato de Concentração nº 08700.001003/2020-37.
[4] Ato de Concentração nº 08700.005815/2020-51.
[5] Ato de Concentração nº 08700.005596/2020-19 (Cheplapharm Arzneimittel GmbH e AstraZeneca AB).
[6] Ato de Concentração nº 08700.004156/2015-79 (Ferrous Resources Limited e IEP Ferrous Brazil LLC).
[7] Parágrafo único do art. 45 do Regimento Interno.
[8] Ato de Concentração nº 08700.006387/2020-84.
[9] Ato de Concentração nº 08700.001227/2020-49.
[10] Procedimento para Apuração de Ato de Concentração nº 08700.005079/2019-06.
[11] Recurso Voluntário nº 08700.006317/2020-26.
[12] Inquérito Administrativo nº 08700.000529/2020-08.
[13] Processo Administrativo nº 08012.008602/2005-09.